Pesquisador do CEE aborda Resiliência na Saúde Pública em seminário da Fiocruz Minas

Pesquisador do CEE aborda Resiliência na Saúde Pública em seminário da Fiocruz Minas

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Para debater os desafios e limites da resiliência na saúde pública, o pesquisador Alessandro Jatobá, coordenador do projeto Tecnologia, Informação e Resiliência em Saúde Pública (ResiliSUS), do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz Antonio Ivo de Carvalho, participou, em 6 de maio de 2025, do seminário Resiliência em Saúde Pública: O que é e o que nunca deve ser, promovido pelo Centro de Estudos da Fiocruz Minas. O evento contou com a presença dos pesquisadores Sérgio William Viana Peixoto, do Instituto René Rachou da Fiocruz Minas, e Marco Paschoalotto, do Centro de Investigação em Ciência Política EGG, da Universidade do Minho, Portugal. A moderação ficou sob responsabilidade das pesquisadoras Fabíola Bof de Andrade e Cristiana Couto Garcia, ambas do Instituto René Rachou.

Com base em um artigo recente publicado no periódico Health Policy and Technology (vol. 14), Jatobá trouxe ao debate o conceito de resiliência, abordando sua definição tradicional como a capacidade de um sistema, organização ou indivíduo de se recuperar após um choque. No entanto, ao ser aplicada à saúde pública, essa concepção exige reflexões mais aprofundadas. “Resiliência não é resignação”, pontuou o pesquisador. “Se resignar é entender que os resultados, principalmente os ruins, são inevitáveis. Ter resiliência é fortalecer a capacidade de controlar o comportamento do sistema de maneira que se consiga influenciar as saídas das funções essenciais de saúde pública”, explicou.

Ter resiliência é fortalecer a capacidade de controlar o comportamento do sistema de maneira que se consiga influenciar as saídas das funções essenciais de saúde pública

Para Jatobá, é essencial diferenciar resiliência de mera resignação diante dos desafios históricos do Sistema Único de Saúde (SUS). "Resiliência é um conjunto de propriedades que são diretamente influenciadas pelo contexto. Quando esse contexto é desfavorável, ele compromete de forma contínua a capacidade do sistema de saúde de se adaptar e absorver os impactos de crises e desastres", ressaltou.

Durante sua apresentação, Jatobá também abordou a definição de choque dentro do contexto da saúde pública. Segundo ele, um choque ocorre quando há um desvio no funcionamento normal de um sistema, seja uma instituição, organização ou indivíduo. Trata-se de um evento inesperado que perturba a operação habitual, exigindo mecanismos de adaptação e recuperação.

Ao tratar sobre a resiliência no SUS, Jatobá destacou que esses choques podem ser episódicos, como desastres naturais ou a pandemia de Covid-19, que exigem respostas emergenciais, ou cotidianos, como o subfinanciamento crônico e as dificuldades enfrentadas pelos profissionais na ponta, incluindo agentes comunitários de saúde que atuam em regiões de alta vulnerabilidade. “O sistema é impactado por choques exógenos, como restrição de orçamento e novas doenças, mas também sofre impactos no funcionamento, normalmente ligados à atuação do dia a dia. A resiliência surgirá da conciliação entre a adaptação dos trabalhadores e a capacidade do sistema de fomentar essa adaptação”, explicou.

O pesquisador alertou para uma interpretação equivocada da recuperação pós-choque, que tradicionalmente sugere um retorno ao estado anterior ao evento. Para ele, essa visão pode ser problemática, uma vez que o estado pré-choque nem sempre representa uma condição ideal. "O SUS redirecionou recursos para disponibilizar leitos de Covid-19 durante a pandemia, isso foi uma demonstração de resiliência. Mas a pandemia acabou, como é que fica a fila de pacientes nesse estado pré-choque?", questionou.

O coordenador do ResiliSUS também lembrou que, até pouco tempo, não havia uma definição consolidada para o termo resiliência em saúde. Para enfrentar essa lacuna e ampliar a visibilidade do tema na pesquisa acadêmica, o laboratório liderou o desenvolvimento e a inclusão do termo resiliência de sistemas de saúde no DeCS (Descritores em Ciências da Saúde), após extensa revisão bibliográfica e experiência na aplicação do conceito. "Em 2023, submetemos ao DeCS a proposta de inclusão do termo resiliência do sistema de saúde. A definição foi oficialmente incorporada em 2024, caracterizando a resiliência como a capacidade de adaptação que o sistema de saúde precisa desenvolver e manter para responder adequadamente a um aumento repentino de demanda causado por eventos extraordinários que afetam a saúde da população direta ou indiretamente”, destacou.

A definição de resiliência foi oficialmente incorporada em 2024, caracterizando a resiliência como a capacidade de adaptação que o sistema de saúde precisa desenvolver e manter para responder adequadamente a um aumento repentino de demanda causado por eventos extraordinários que afetam a saúde da população direta ou indiretamente

Em sua exposição, Jatobá também apresentou a estrutura CoRes (Coeficiente de Resiliência), um modelo desenvolvido pelo ResiliSUS que utiliza aprendizado de máquina para analisar o desempenho de funções essenciais de saúde e prever até que ponto os sistemas podem responder a diversas pressões.

Segundo Jatobá, os blocos de construção propostos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2015, como um mecanismo para fortalecer sistemas resilientes às mudanças climáticas passam a ser utilizados como um framework para a construção de sistemas resilientes em geral a partir da pandemia de Covid-19. “O CoRes reúne indicadores que são computados e calculados, utilizando machine learning, isto é, modelos de aprendizado de máquina”, completou.

Ao concluir, Jatobá reforçou a resiliência como um princípio fundamental, inclusive, para a preparação frente a novas pandemias e sugeriu que essa preparação deve envolver um monitoramento contínuo das funções essenciais de saúde pública, aprendizado a partir de sucessos e falhas e o uso da ferramenta CoRes como um instrumento para garantir respostas mais eficientes. Segundo ele, a construção de um futuro mais preparado passa por essa discussão, uma vez que a pandemia evidenciou a relevância da resiliência na saúde pública.