A crescente força das gerações grisalhas no Brasil. Artigo de José Eustáquio Diniz Alves

A crescente força das gerações grisalhas no Brasil. Artigo de José Eustáquio Diniz Alves

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Publicado no site da Ecodebate 

O Brasil está passando por um profundo e rápido processo de mudança da sua estrutura etária. A sociedade brasileira teve uma base populacional rejuvenescida durante cerca de 500 anos. Mas a dinâmica demográfica já está mudando e terá uma inversão completa ao longo do século XXI.

No passado, a grande maioria da população brasileira tinha menos de 50 anos de idade, mas, em um futuro não muito distante, o conjunto das diversas gerações grisalhas (50+) serão maioria da população. Na segunda metade do século XX, o Brasil tinha uma oferta quase ilimitada de mão de obra jovem, o que possibilitou o aproveitamento parcial do 1º bônus demográfico.

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De fato, como mostra o gráfico abaixo, com dados da Divisão de População da ONU (revisão 2024), a população brasileira de 0-49 anos era de 48,6 milhões de pessoas em 1950 e subiu até o pico de 155,4 milhões em 2015, mais do que triplicando em 65 anos. Porém, a população de 0-49 anos já está decrescendo (atingiu 152 milhões de pessoas em 2025) e deve ser reduzida por cerca da metade do valor máximo da série, ou seja, caindo para 78,4 milhões de pessoas em 2100.

Desta forma, atualmente, o Brasil vive a dupla realidade de uma diminuição absoluta da quantidade de “jovens” (com menos de 50 anos) e um crescimento acelerado, absoluto e relativo da população “idosa” (50+). O número total de pessoas com 50 anos e mais de idade era de 4,8 milhões de pessoas em 1950, alcançou 26,3 milhões no ano 2000, chegou a 60,7 milhões de pessoas em 2025, deve atingir o pico de 98,8 milhões em 2067 e, acompanhando a tendência do total da população brasileira, deve apresentar uma redução para 85 milhões de pessoas em 2100.

gráfico da população por faixa etária no Brasil

 

Considerando os 150 anos entre 1950 e 2100, a população total do Brasil deve crescer 3,1 vezes, a população de 0-49 anos deve crescer 1,6 vezes e a população de 50 anos e mais de idade deve crescer impressionantes 17,6 vezes, com destaque para os grupos mais idosos. O Brasil passa não só por um processo de envelhecimento, mas também por um envelhecimento do envelhecimento.

A população de 50-59 anos era de 2,7 milhões de pessoas em 1950 e deve atingir 19,8 milhões em 2100, um aumento de 7,3 vezes. No mesmo período, a população de 60-69 anos era de 1,4 milhão e deve atingir 20,7 milhões, um crescimento de 14,8 vezes. A população de 70-79 anos era de 541 mil pessoas e deve chegar a 20,5 milhões, um crescimento de 37,8 vezes. E a população de 80 anos e mais de idade era de somente 184 mil pessoas em 1950 e deve chegar a 23,9 milhões de pessoas em 2100, um crescimento de estonteantes 131 vezes.

O gráfico abaixo, também com dados da Divisão de População da ONU, mostra que o grupo etário 0-49 anos representava mais de 90% da população brasileira entre 1950 e 1970, mas diminuiu nas últimas décadas, chegou a 71% em 2025 e deve ficar abaixo de 50% nos últimos 25 anos do século XXI. Em rota inversa o grupo etário de 50 anos e mais de idade representava menos de 10% da população brasileira entre 1950 e 1970, subiu para 29% em 2025 e deve ultrapassar 50% a partir da década de 2070.

gráfico da percentagem da população de 0 49 anos e 50 anos mais no Brasil

 

A análise da mudança da estrutura etária brasileira indica que a economia brasileira, progressivamente, passará a contar cada vez mais com a produção e o consumo da população de 50 anos e mais de idade. A combinação de uma população mais madura e mais escolarizada possibilitará o aproveitamento do 2º bônus demográfico (ou bônus da produtividade).

O aumento da proporção da população do topo da pirâmide etária e o aumento da idade média da força de trabalho indicam que o progresso do Brasil dependerá cada vez mais do aporte das gerações grisalhas (ou prateadas) para o aproveitamento de um 3º bônus demográfico, também chamado de dividendo da longevidade.

economia prateada (ou grisalha) – que ganha crescente relevância nos países avançados na transição demográfica – consiste no desenvolvimento de um sistema de produção e consumo no qual pessoas com 50 anos ou mais se inserem no mercado de trabalho, colaboram com o sistema produtivo, se envolvem em projetos inovadores, impulsionam o desenvolvimento socioeconômico e ampliam os mercados de trabalho e consumo.

Essa economia é vista como uma oportunidade crescente para a iniciativa privada e para o avanço das políticas públicas, uma vez que uma população mais longeva tende a possuir maior experiência, poder aquisitivo e demanda por produtos e serviços que atendam às suas necessidades específicas.

Simultaneamente, a economia prateada representa uma chance de conectar diferentes gerações, reduzindo o isolamento e a solidão entre os idosos, além de aumentar as oportunidades de diversidade etária e de maior intergeracionalidade nas organizações econômicas e sociais.

Ao promover um envelhecimento saudável e múltiplas conexões sociais, livres de discriminação etária, o Brasil poderá contar com um contingente significativo de pessoas maduras, capazes de construir uma velhice ativa, inovadora, produtiva e colaborativa. Isso, de forma plena, contribuirá para o bem-estar de toda a população, em um ambiente de solidariedade intergeracional.`

José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382