Consummatum est – e uma página foi definitivamente virada
Quarta-feira, 31 de agosto de 2016, concluiu-se definitivamente o longo ciclo democratizador iniciado no Brasil ainda nos anos 1970. O placar da votação no Senado – 61 a 20, para o impeachment, quer dizer o golpe parlamentar-midiático – dá a noção do tamanho da derrota e do isolamento da esquerda, para além do que se abateu sobre Dilma Rousseff. Ela bravamente enfrentou seus algozes, mas, como de hábito, fugiu à responsabilidade pela situação a que chegamos. Não vale a pena repetir aqui as constatações e indagações sobre o que significa o impeachment de dois presidentes desde o retorno das eleições diretas, obviamente fenômeno estranho e que vem levando alguns a falar de um semiparlamentarismo, que, no entanto, não guarda abrigo na Constituição.
Note-se, sim, a fragilidade do presidente agora efetivo, Michel Temer, frente ao Congresso, em especial frente ainda ao ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e sobretudo ao do Senado, Renan Calheiros, que mais uma vez deu um show de raposismo político e demonstrou seu poder ao comandar o PMDB na manutenção inesperada dos direitos políticos da ex-presidente, o que de resto pode ajudar Cunha daqui a pouco. A fragilidade de Temer vem também de sua rejeição pela população, que certamente o rejeitará mais à medida em que busque concretizar o tal do ajuste neoliberal que prometeu, ao passo que o empresariado e o PSBD querem que ele cumpra sua promessa, o que dificilmente poderá fazer. Que revolta popular e repressão, bem como um aprofundamento da crise econômica, são bem possíveis embora não inevitáveis, não deve ser perdido de vista.
Resta saber assim como será o governo Temer de fato, como reagirão a esquerda e a sociedade. Os dois próximos anos serão de transição, não se sabe bem, contudo, para onde.
No artigo aqui ajuntado em hiperlink, publicado no site do OpenDemocracy, faço um balanço de conjunto do processo: https://www.opendemocracy.net/
* Professor do Iesp-Uerj, pesquisador associado ao CEE-Fiocruz e autor de O Brasil entre o passado e o futuro (Rio de Janeiro: Mauad, 2015, 2ª edição).