A saúde como pilar do desenvolvimento sustentável
A realização da COP30 no Brasil reforça a necessidade e a urgência do debate sobre a transformação ecológica. Ao refletir sobre o tema, o coordenador do projeto Desenvolvimento Sustentável, CT&I e Complexo Econômico-Industrial da Saúde (GPCEIS) do CEE-Fiocruz, Carlos Gadelha, em conjunto com Maria Augusta Arruda, diretora do Laboratório Nacional de Biociências do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBio/CNPEM), e Marcelo Manzano, diretor do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade de Campinas (CESIT/IE-Unicamp), elaboraram o artigo A Saúde como Pilar do Desenvolvimento Sustentável, divulgado no jornal Valor Econômico do dia 19/11/25.
Nas últimas décadas, o agravamento da crise ambiental e climática evidencia a desconexão entre o modelo de produção e consumo da sociedade e as necessidades sociais e ambientais. A saúde não está à parte desse cenário. Ao mesmo tempo em que os sistemas de saúde sofrem com as pressões geradas por esse modelo, também contribuem para a crise ambiental. Portanto, a saúde pode ser parte fundamental da solução, ajudando a construir um padrão de desenvolvimento sustentável que reposicione as relações entre economia, sociedade e natureza.
Ao redor do mundo, a saúde já responde à crise climática com soluções inovadoras, como o uso de biomateriais biodegradáveis em próteses e dispositivos médicos, e o mapeamento genético da biodiversidade, que representam enorme potencial para a descoberta de novos fármacos e valorizam a floresta em pé. Para que essas iniciativas avancem, no entanto, é preciso ir além de soluções pontuais: é necessária uma mudança estrutural, capaz de promover um padrão não predatório de uso dos recursos naturais.
Estudo coordenado pelo GPCEIS do CEE-Fiocruz, em parceira com o LNBio/CNPEM e o IE-Unicamp, mostra que o Complexo Econômico-Industrial da Saúde, uma das seis áreas prioritárias da Nova Indústria Brasil (NIB), desponta como pilar estratégico para alavancar esta mudança, ao integrar CT&I e produção nacional aos desafios do Sistema Único de Saúde (SUS), o maior sistema universal de saúde do mundo em termos de população.
Atualmente, a saúde mobiliza cerca de 10% do PIB, respondendo pela geração de mais de 10 milhões de empregos diretos, além de representar 30% do investimento em P&D, com alta interação e oportunidades advindas da biodiversidade brasileira. Estima-se que o Brasil concentre entre 15% e 20% de toda a diversidade biológica existente no planeta, ocupando a 6ª posição mundial quando o assunto é pesquisa em biodiversidade, o que corresponde a 7,5% do número de publicações científicas — um valor significativamente superior à média de 2% nas publicações científicas em geral.
Os estudos de prospecção mostram que os biomas brasileiros devem ser compreendidos como reservas naturais a serem preservadas, mas também como plataformas de inovação científica e tecnológica, que podem ser translacionadas para o atendimento das demandas de saúde da população brasileira, superando a tradicional segmentação entre políticas sociais, ambientais e econômicas.
A Amazônia, por exemplo, oferece base genética para prospecção de fármacos, vacinas, fitoterápicos e biomateriais, enquanto o Cerrado aparece com compostos antioxidantes e anti-inflamatórios. A Mata Atlântica destaca-se em fitoterápicos e insumos farmacotécnicos, como o medicamento Acheflan, desenvolvido a partir da erva-baleeira (Cordia verbenaceae) para tratamento de inflamações. A Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro, reúne moléculas antivirais, anti-inflamatórias, antibióticas, cicatrizantes — como o óleo de licuri (Syagrus coronata) —, e com potencial anticâncer, a exemplo dos derivados do lapachol, extraído de plantas do gênero Tabebuia avellanedae, capazes de inibir a proliferação de células metastáticas.
No presente, essa condição singular confere ao Brasil a oportunidade de articular biodiversidade e desafios de saúde em um Projeto Nacional comprometido com a transformação produtiva e a mudança estrutural. A saúde desponta como pilar estruturante para a alavancar essa transformação, articulando CT&I e produção local com sustentabilidade, bem-estar e soberania.
Leia o artigo completo no jornal Valor Econômico


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