O desenvolvimento em prol da transformação social é tema da aula inaugural do Doutorado Profissional em Saúde Pública da Ensp
Com informações do Informe Ensp*
O desenvolvimento entendido como processo de mudança social, em que necessidades humanas são satisfeitas por meio de uma diferenciação no sistema produtivo, gerada pela introdução de inovações tecnológicas. A partir dessa reflexão, baseada no pensamento do economista Celso Furtado (1920-2004), o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e do Complexo Econômico Industrial da Saúde do Ministério da Saúde (Sectics/MS) e coordenador científico do CEE-Fiocruz, Carlos Gadelha, iniciou sua palestra na aula inaugural da primeira turma do Doutorado Profissional em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), em 2/8/2024.
Sob o título Ciência, Saúde e Desenvolvimento, a exposição de Gadelha orientou-se pelo conceito amplo de saúde, relacionado não apenas à ausência de doença, mas à qualidade de vida e a políticas sociais e econômicas voltadas a esse fim, e trouxe aos presentes a agenda da política de ciência e tecnologia do Ministério da Saúde no atual governo, “cuja missão última é contribuir para o nosso Sistema Único de Saúde”, conforme afirmou o secretário, que será também professor do curso.
Participaram da mesa de abertura o presidente da Fiocruz, Mário Moreira; o diretor da Ensp, Marco Menezes; a vice-diretora de Ensino da Escola da Escola, Enirtes Caetano; a coordenadora do Programa Profissional de Saúde Pública, Gisela Cardoso; a coordenadora-geral de Educação da Vice-presidência de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Eduarda Cesse; e a vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Cristiani Vieira Machado.
Carlos Gadelha enfatizou a necessidade de criar estratégias e construir convergências para que se avance nas políticas propostas, “sair da cadeira e fazer acontecer as ideias”, disse. “O desenvolvimento envolve transformação, organização da sociedade para fazer mudanças. E envolve disputas e estabelecimento de consensos”.
Gadelha defendeu a articulação entre as transformações políticas, sociais, ambientais e na vida com as transformações econômicas, produtiva e da Ciência, Tecnologia & Inovação. “Conhecimento, tecnologia, inovação, sustentabilidade ambiental, inclusão social e equidade são partes de uma mesma matriz”, observou, defendendo um sistema econômico em que vacinas, medicamentos, equipamentos sejam produzidos de modo mais competitivo, não com monopólios, que dominam a produção; um sistema produtivo com valorização dos trabalhadores, melhores salários e maior aporte de ciência, tecnologia e inovação.
Como exemplo dessa articulação, Gadelha citou a área da assistência farmacêutica, que concentra ciência, tecnologia, inovação, direito social e atuação do SUS. “Uma única pílula traz o modelo da sociedade toda”, definiu.
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O secretário também apresentou as ações do governo contempladas pelas Políticas Nacionais de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. Ele lembrou que, em 2023, a C&T&I voltou a ser prioridade do governo e reforçou são essenciais para o futuro sustentável e soberano do SUS. Conforme apontou Gadelha, o orçamento de C&T&I, em 2023, foi três vezes superior e, em 2024, aumentou cinco vezes. A previsão de investimentos na área, para o período de 2023 a 2026, prosseguiu, é de R$ 2,2 bilhões, o que representa recorde histórico, desde a criação da Secretaria de Ciência e Tecnologia.
Ele destacou, ainda, as chamadas públicas na área de CT&I em Saúde, que o governo lançou em 2023, com o orçamento total de R$ 357 milhões, tendo como foco os campos de saúde pública de precisão – que permite lidar com diferentes perfis de pessoas e grupos, levando em conta a diversidade da população brasileira com visão pública, coletiva e de equidade; estudos transdisciplinares em saúde coletiva – trabalhando-se “por problema e não por departamento”, como no caso da Covid-19, cujo enfrentamento envolveu ciência biomédica, equipamentos, vacina, organização da atenção básica, vigilância preditiva, entre outros aspectos; pesquisa em tuberculose e fortalecimento da vigilância; ciência de dados; mudanças climáticas e saúde; e evidências em saúde.
Como enfatizou Gadelha, saímos de um período em que se propunha política de saúde sem ciência. “A estratégia de pesquisa e de um gestor público envolve sempre a criação de viabilidades e projetos que gerem consenso para mudarmos a realidade”, frisou.
O secretário anunciou que, em breve, será lançado o Programa Pesquisa para o SUS (PPSUS), que envolve os 27 estados da federação, com pactuação federativa para o enfrentamento conjunto de grandes problemas da saúde coletiva e do SUS, sob os princípios de transdisciplinaridade, redes de pesquisa, equidade de gênero e de raça.
Também em 2024, o governo lançará nove chamadas públicas, com investimento de R$ 234 milhões, enfatizando as áreas de genômica e saúde de precisão; doenças determinadas socialmente; doenças e agravos não transmissíveis; prevenção e enfrentamento à desinformação; e pesquisas pré-clínicas e clínicas para o SUS, entre outras.
Gadelha destacou o Complexo Econômico-Industrial da Saúde como uma nova aposta para o Brasil e frisou que o campo da saúde nacional é sistêmico. Como definiu, a saúde configura “um mega sistema” que envolve a produção de base química e biotecnológica, a produção de equipamentos de base mecânica eletrônica e de materiais, além de todo o campo de geração de serviços em saúde – da atenção primária à alta complexidade – tendo em seu coração toda a área de informação e conectividade. “Um único produto mobiliza um sistema produtivo, econômico e tecnológico. Se uma das partes do sistema não funciona o sistema desaba – se não tenho vacina, o sistema desaba; se não tenho hospital, o sistema desaba; se não consigo fazer diagnóstico, o sistema desaba”, exemplificou. “Pensem sistemicamente”, aconselhou, defendendo também a articulação entre políticas de diversos campos, desenvolvidas pelos diferentes ministérios, e uma nova geração de políticas públicas e institucionais que “olhem para fora das caixas setoriais”, em nome de grandes desafios da sociedade brasileira e global.
Novo doutorado, uma conquista da Fiocruz
Na mesa de abertura da aula inaugural da primeira turma do Doutorado Profissional em Saúde Pública, o diretor da Ensp, Marco Menezes, destacou a importância da iniciativa para enfrentar desafios atuais no SUS. "Sempre que se inicia uma nova turma, é um momento de alegria e acolhimento, mas também de motivação para enfrentar os grandes desafios que temos pela frente para a sociedade, para a saúde coletiva e para o SUS", declarou. Menezes lembrou que o enfrentamento das desigualdades socioambientais é uma diretriz institucional da Escola e citou, entre os desafios atuais, a emergência climática, a preparação para novas pandemias e a transição demográfica.
Para o diretor, a primeira turma do programa é uma conquista da Fiocruz na direção do fortalecimento do sistema de saúde público. "Esse momento de focar na formação de trabalhadoras e trabalhadores é muito importante para enfrentar um dos grandes desafios do SUS hoje: a gestão de pessoas e de trabalho, falar de trabalho e formação de forma integrada", considerou.
A vice-diretora de Ensino da Ensp (VDE/Ensp), Enirtes Caetano, ressaltou a relevância do Programa de Saúde Pública da Escola, que, ao longo dos seus 48 anos, formou grande parte dos sanitaristas brasileiros. Enirtes reforçou o comprometimento da Ensp com o futuro do SUS e da ciência. "São programas voltados a oferecer respostas, é uma ciência comprometida com o cotidiano das instituições e da população brasileira, que precisa oferecer respostas em um patamar de excelência", afirmou. Segunda a vice-diretora, há um compromisso do corpo discente e da Escola em oferecer o que há de melhor no momento.
Para a coordenadora do Programa Profissional de Saúde Pública, Gisela Cardoso, o Doutorado Profissional rompe com a hegemonia do setor acadêmico como produtor de conhecimento. "As instituições de pesquisa e ensino se aproximam da sociedade no sentido de dar uma resposta às questões e problemas que ela identifica no campo da saúde pública e coletiva", observou.
Coordenadora-geral de Educação da Vice-presidência de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Eduarda Cesse destacou a característica vanguardista da instituição ao dar as boas vindas à nova turma. Ela celebrou o novo curso como um feito. “A Fiocruz é uma das instituições que lideraram o início da formação profissional na pós-graduação do país. Quando essa modalidade surgiu no Brasil, ao final da década de 1990, a Fundação saiu na frente”, recordou. Cesse chamou atenção também para a articulação entre teorias e práticas no campo da saúde coletiva e saudou os novos alunos: “É mais uma turma que vai desbravar caminhos”.
Conforme enfatizou a vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Cristiani Vieira Machado, o Doutorado Profissional da Ensp foi construído “a muitas mãos, com amor, carinho e trabalho coletivo”. Também pesquisadora da Escola, Cristiani lembrou que, neste ano, a Ensp está completando 70 anos de trajetória de formação de quadros para a saúde pública, o que torna a nova turma ainda mais especial. “Além disso, é especial por envolver profissionais da Atenção Primária e da gestão da Ciência e Tecnologia da própria Fiocruz. Não existe SUS integral, público e gratuito sem a reflexão crítica sobre os determinantes sociais da saúde, sem a promoção da saúde, a atenção à saúde em vários níveis e o acesso a medicamentos, a vacinas, à tecnologia”.
O presidente da Fiocruz, Mario Moreira, convocou os novos alunos a contribuir no enfrentamento ao desafio de pensar o SUS “numa perspectiva atualizada”, diante da nova realidade do país. “O sistema datado do final da década de 1980 encontra um país totalmente diferente hoje. É outra realidade ambiental, social e sanitária”, observou. “O país envelheceu, e isso traz desafios imensos. Temos uma população importante que sofre de agravos próprios do envelhecimento, como doenças cardíacas, neurodegenerativas, metabólicas”.
O presidente acrescentou, ainda, nesse cenário o incremento das doenças e mortes ligado à violência, “o que requer de nós um esforço também de atualização das políticas, dos programas e, quem sabe, mesmo do próprio sistema”, alertou, sublinhando a necessidade de cultivar e fortalecer os princípios e valores do SUS.
Por fim, ele citou a questão climática, o pensamento em perspectiva global e também com os territórios como aspectos estratégicos da agenda da saúde.
Também na mesa de abertura, Carlos Gadelha destacou a relevância da Ensp e do Programa de Saúde Pública. "Vejo esta turma como parte da reconstrução que estamos fazendo no país e acho importante observar como o Ministério da Saúde e as políticas de saúde precisam desses programas de formação, qualificação e educação da Fiocruz", considerou.
Gadelha destacou a importância de se contar com profissionais que saibam fazer a translação do conhecimento acadêmico em políticas públicas e institucionais. Para o secretário, os futuros doutores devem ser agentes de transformação na Saúde Pública, para que seja possível fortalecer, ampliar, modernizar e avançar no SUS.
Encerrando a mesa de abertura da aula inaugural, foi realizada a apresentação do Rap da Saúde SMS, uma rede de adolescentes e jovens promotores da saúde, que fazem parte do curso desenvolvido pela Secretaria Municipal de Saúde da cidade do Rio de Janeiro.
* Com informações da cobertura publicada no Informe Ensp, em 05/08/2024, por Barbara Souza, Bruna Abinara e Danielle Monteiro.