Para fazer frente à maior ameaça à saúde global no século XXI, representada pelas mudanças climáticas, a necessária transição para um novo padrão de desenvolvimento tem pautado a participação do Brasil nos grandes fóruns de geopolítica internacional. “A sociedade moderna precisa se descarbonizar”, afirma a economista Carolina da Silveira Bueno, em entrevista ao blog do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz. Ela integra o grupo de pesquisadores do Centro que vem estudando o assunto sob o prisma do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. “Qual é, de fato, a grande oportunidade diante da transição ecológica? É mudar a nossa estrutura de produção, porque temos um problema enorme de dependência externa.  A saúde oferece uma grande oportunidade para essa mudança, para uma nova forma de funcionamento da economia, que considere não só a questão ecológica da transição, mas, também, os sistemas produtivos!”, diz a pesquisadora.

Os pesquisadores desse grupo destacam o CEIS como “o motor para essa nova industrialização” no Brasil. O fortalecimento de sua base produtiva, na avaliação deles, oferecerá a oportunidade de reduzir a nossa dependência por insumos para a saúde, e criará condições para uma nova forma de economia, alicerçada sobre as dimensões econômicas, sociais e ambientais do desenvolvimento. O grupo reputa, ainda, ao SUS um papel estratégico na promoção dessa transição, pelos valores de equidade, universalidade e integralidade que o definem.

O novo modelo de desenvolvimento, cujo mote é “a economia a serviço da vida e do planeta”, promete reverter a lógica predominante de um modelo de produção que, como avaliam os pesquisadores, tem, até agora, se baseado em exportação de commodities, baixo uso de tecnologia, subempregos e degradação ambiental. “Um modelo que traz estagnação, não promove crescimento e é predatório”, diz Carolina.

Ao prospectarem o futuro, não um futuro distante, mas aquele fruto da ruptura desse modelo, esse grupo de jovens pesquisadores volta seu olhar para a elaboração de políticas públicas que possam subsidiar o fortalecimento do CEIS, visando a sustentabilidade do SUS. Pois como sublinha o economista Felipe Duvaresch Kamia, também integrante da equipe: “Sem o SUS não é possível garantir o desenvolvimento sustentável e sem o fortalecimento dos CEIS não se pode garantir o SUS.” Veja a seguir a entrevista realizada com os dois pesquisadores.

Leia a seguir a entrevista realizada com os dois pesquisadores.

A ministra Nísia no encontro do grupo de trabalho da Saúde do G20, em agosto, destacou o papel central da saúde no G20 como parte estruturante de um novo padrão de desenvolvimento econômico sustentável, que seja local, regional e global. Que aspectos do CEIS podemos destacar para uma contribuição à nova industrialização do país, com base no desenvolvimento local, de forma sustentável?

Carolina: Nosso grupo está trabalhando há cerca de dois anos com as questões da agenda ambiental.  Já é consenso que estamos vivendo um momento de rupturas. Essas rupturas são causadas pelos modelos de produção existentes. No caso do Brasil, temos um modelo de financiamento econômico, pautado principalmente no agronegócio, com importação de tecnologias, subempregos e degradação ambiental. É um modelo que traz estagnação, não promove crescimento e é predatório. Nosso grupo de pesquisa escreveu um capítulo sobre esse tema para o livro Saúde é desenvolvimento: o Complexo Econômico-Industrial da Saúde como opção estratégica nacional, intitulado Estagnação predatória ou desenvolvimento sustentável?  

A discussão para a transição ecológica já está em curso, pois a sociedade precisa se descarbonizar. O tema está presente no debate do G20, na geopolítica global, nas falas do presidente Lula, nas falas da ministra Nísia. Qual é, de fato, a grande oportunidade diante da transição ecológica? É mudar a nossa estrutura de produção, porque temos um problema enorme de dependência externa.

A saúde oferece uma grande oportunidade para essa mudança, para uma nova forma de funcionamento da economia, que considere não só a questão ecológica da transição, mas, também, os sistemas produtivos. A partir do fortalecimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, ela será o motor para essa nova industrialização, considerando a sustentabilidade, a sociedade, a vida das pessoas e do planeta.

Essa é a mensagem principal que a pasta da Saúde vem manifestando, inclusive em fóruns internacionais como o G20. Nós temos, a partir do CEIS e de sua base produtiva, uma oportunidade enorme de reduzir a nossa dependência por insumos farmacêuticos, por exemplo, que hoje está em 90%, e criar as condições para uma nova forma de economia. Essa, sim, com alto valor agregado, geração de bons empregos e permitindo a descarbonização da economia nacional.

É impossível separar as dimensões econômicas, sociais e ambientais do processo de desenvolvimento 

Quais são as bases conceituais do CEIS?

Felipe: O trabalho de investigação do nosso grupo de pesquisa começou com uma provocação de Carlos Gadelha, coordenador científico do CEE e atualmente à frente da Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Complexo da Saúde do Ministério da Saúde (SECTICS/MS). Em uma entrevista dada em 2017, à equipe da Rede Brasil Saúde Amanhã, ele que, na época, era coordenador das Ações de Prospecção da Fiocruz, afirmou: “Sem o SUS não há desenvolvimento sustentável’’. A partir dessa provocação, começamos a pensar e tentar estruturar qual seria o papel do SUS na promoção de uma transição que é inevitável e já está acontecendo. Mas essa transição precisa ser justa e, como diz Paulo Gadelha, coordenador da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030, dar sentido aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

A premissa fundamental, presente na base conceitual do CEIS, é que é impossível separar as dimensões econômicas, sociais e ambientais do processo de desenvolvimento. Dentro do contexto capitalista, sabemos que a tendência não é gerar um desenvolvimento sustentável no sentido social, econômico e ambiental. É um desenvolvimento que gera inovações, um avanço material extraordinário, mas, ao mesmo tempo, em seu processo, gera assimetrias, exclusão, desigualdades e graves problemas ambientais. Então precisamos entender qual é a posição da saúde, do SUS e do CEIS nesse processo.

Quando reafirmamos na nossa Constituição um SUS universal, integral e equânime, estamos escolhendo um modelo de sociedade que carrega, inerentemente, os valores do desenvolvimento sustentável. O que precisamos é incorporar para dentro do SUS todo o avanço que tivemos, ao longo das últimas décadas, no entendimento do impacto das mudanças climáticas na saúde. Quando houve a COP26, a própria OMS divulgou o relatório The Health Argument for Climate Action, com um conjunto de ações prioritárias da comunidade global de saúde, voltadas aos governos e aos políticos para que atuem com urgência nas atuais crises climáticas e de saúde.

Nesse documento, a OMS reconhece as mudanças climáticas como a maior ameaça à saúde global do século XXI. Em seu prefácio, seu diretor-geral Tedros Adhanom ressalta que a Covid-19 só demonstrou a realidade desse argumento.

Carolina: A ciência tem avançado muito, tanto em termos globais quanto nacionais, inclusive aqui na Fiocruz, no sentido de entender os impactos das mudanças climáticas e da perda de biodiversidade sobre a saúde humana. Essa compreensão é amparada em um conhecimento que já temos e reafirmamos, há décadas, sobre a questão dos determinantes sociais de saúde.

As mudanças climáticas e a perda de biodiversidade, em curso, estão pressionando os sistemas sociais, ambientais e econômicos, e representam graves ameaças à saúde global. Porém, como foi visto durante a pandemia, esse impacto será muito diferenciado de acordo com a estrutura social. As populações mais vulneráveis serão as mais afetadas, até porque têm menos capacidade de se adaptarem a essas mudanças.

O ponto de partida da abordagem dos CEIS não é investigar os impactos das mudanças climáticas sobre a saúde, pois isso já vêm sendo extensamente discutido, debatido e investigado pela ciência, inclusive dentro da Fiocruz temos inúmeros exemplos disso. Nosso objetivo é conseguir propor ações e caminhos para que o SUS consiga alcançar essa transição justa para um novo modelo de desenvolvimento, que seja, de fato, sustentável. Pelo fato de já carregar os valores da equidade, da universalidade e da integralidade, entendemos que o SUS é um vetor fundamental para promovê-la.
 

A pandemia expôs nossa dependência produtiva diante do mercado internacional de vacinas e insumos. A partir do conceito do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, como deve ser estruturada a transição sustentável do SUS de forma a garantir o acesso universal à saúde, como vem preconizando o Conselho de Economia da Saúde para Todos, da OMS?

Carolina: Quando falamos como o CEIS pode ser central para essa nova indústria, estamos olhando para as questões estruturais da economia. Esse é o ponto focal do nosso grupo: as questões estruturais de mudanças significativas sociais, econômicas e ambientais. Isso porque o CEIS promove uma indústria que permite uma nova forma de financiamento da economia nacional, baseada em alta tecnologia, e reverte a lógica predominante de um modelo de produção baseado fundamentalmente em matérias-primas.
 

Como a nova indústria do CEIS pode contribuir para reverter essa lógica?

Carolina: Primeiro o país precisa produzir internamente dentro de um conceito de transição justa. A substituição das importações é uma meta importante e o conhecimento da biodiversidade existente no país também. O Brasil tem seis biomas: a Caatinga, a Amazônia, a Mata Atlântica, Cerrado, Pantanal e Pampa. É preciso saber como o CEIS pode conhecer a potencialidade dessa biodiversidade de forma sustentável, a partir das novas tecnologias de fármacos e de bioprodutos. Que conhecimento pode ser gerado a partir dessa nova matriz industrial? É fundamental saber isso.

Essa nova indústria não é pautada na lógica da produção de commodities. É uma economia baseada no conhecimento, no conhecimento das plantas, da floresta, e de como isso gera produtos para o CEIS, para a indústria farmacêutica, por exemplo.

Não nos referimos somente à indústria de alta tecnologia, mas a uma nova indústria que vai produzir máscaras, luvas e dispositivos, produtos que também devem fazer parte de uma pauta sustentável. Estamos falando de sustentabilidade no seu sentido amplo, não somente ecológica, mas no sentido social, uma indústria que gera emprego e renda e promove a descentralização da produção, utilizando os espaços de forma eficiente, e considerando o uso da água, da energia e todos os aspectos de uma nova economia.

Pensamos essa nova indústria a partir dessas orientações que é o CEIS hoje e como vislumbramos o CEIS de amanhã.

Sem o fortalecimento dos CEIS não se pode garantir o SUS e sem o SUS não há desenvolvimento sustentável

Que outros aspectos estão envolvidos no conceito de transição sustentável do SUS, que podem servir de parâmetros para a indústria da saúde em relação à inovação, visando ao acesso universal e à sustentabilidade do sistema público de saúde, como preconiza a abordagem emergente da inovação responsável em saúde?

Felipe: Já falamos que sem o SUS não é possível garantir o desenvolvimento sustentável. A outra parte do argumento dos CEIS é que, sem o fortalecimento de uma base produtiva e de inovação, não é possível garantir o SUS. É preciso fortalecer a base produtiva e de inovação do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, que envolve desde as indústrias até os serviços. Não se separa a indústria dos serviços, porque, como a Fiocruz ensina de longa data, não existe vacina sem vacinação. A inovação sem chegar à ponta, sem chegar ao SUS, não gera acesso. Portanto, sem o fortalecimento dos CEIS não se pode garantir o SUS, e sem o SUS não há desenvolvimento sustentável.

As dimensões social, econômica e ambiental não podem ser separadas quando se discute o processo de desenvolvimento. A transição para um novo padrão de desenvolvimento só será justa e sustentável se garantir a geração de renda, de empregos de boa qualidade e bem remunerados para a população. Se tivermos que fazer uma transição do SUS e desempregar milhares de enfermeiros e técnicos, não será uma transição justa. É preciso criar as condições para empregos de boa qualidade, ter uma produção de boa qualidade, de alto valor agregado, que gere mais empregos, renda e que seja sustentável. Do contrário, se promoverá a sustentabilidade ambiental às custas das pessoas. E aí não será uma transição justa.

Pelo padrão tecnológico que temos hoje, para se produzir saúde, aumentamos as emissões. Já existem diversos relatórios mostrando que os países com os sistemas de saúde mais avançados são os que emitem mais gases de efeito estufa. Ou seja, para fortalecer os sistemas de saúde hoje, é preciso aumentar a pressão sobre o meio ambiente. Então, se entendemos que a mudança climática vai afetar intensamente as condições de saúde, entendemos, também, que a saúde deve liderar, pelo exemplo, e ter uma produção que não seja insustentável.

O desenvolvimento para prover saúde não pode pressionar ainda mais o meio ambiente. Logicamente que essa transição ecológica do sistema de saúde não pode ser feita às custas da resolutividade do sistema de saúde, piorando seu funcionamento. A saúde hoje é um dos campos mais dinâmicos na economia capitalista. As indústrias de saúde são muito lucrativas. Os serviços de saúde têm um peso econômico extraordinário. Hoje, o Complexo Econômico- Industrial da Saúde representa quase 10 % do PIB do Brasil. Os setores associados à saúde apresentam um grau de inovação elevadíssimo. Então, isso faz com que a saúde seja um espaço estratégico para liderar e puxar esse processo de transição ecológica.

Entendemos que, a partir da saúde, é possível induzir um processo de transição que pode se difundir para outros segmentos econômicos. Por isso a nossa aposta, o entendimento do nosso grupo de pesquisa, é que a transição do CEIS e do SUS são fundamentais para a promoção do desenvolvimento sustentável.

Com base no conceito de transição sustentável do SUS, o primeiro aspecto que deve servir de parâmetro para a indústria da saúde é aliar a produção e a inovação ao acesso universal. A inovação tem que chegar para todos. Se não chega na ponta, não se transforma em acesso, não é responsável e não é sustentável. Esse é o primeiro ponto que podemos trazer da abordagem do CEIS.

Carolina: Um outro ponto é pensar em processos de inovação que promovam a descarbonização do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. Por um lado, podemos pensar nessa perspectiva da descarbonização, pensar como o processo de inovação de saúde pode transformar a estrutura produtiva da saúde, transformar os produtos de saúde para eles se tornarem mais sustentáveis, ou seja, tentar reduzir a associação corrente, atualmente, que, para se gerar mais saúde, é preciso emitir mais. Temos que romper com essa lógica.

Além disso, precisamos pensar a inovação em um sentido mais amplo, que envolva a transformação das estruturas sociais também. Qual foi a principal inovação em saúde do Brasil nas últimas décadas? Foi a criação do SUS. Então temos que investir muito fortemente na atenção básica, evitando o surgimento de agravos em saúde que levam à necessidade de usar mais produtos e mais insumos poluentes. Evitar a doença é uma ótima forma de evitar as emissões do sistema de saúde.

Ao mesmo tempo, podemos investir nas tecnologias digitais 4 .0, por exemplo, em big data e inteligência artificial para conseguirmos nos antecipar às emergências de saúde. E, a partir do entendimento do que está acontecendo, pensar em estratégias de adaptação e mitigação.

Como o Brasil pode avançar no sentido de promover essa transição ecológica do SUS?

Carolina: Consideramos que existem dois caminhos. O primeiro será investir no processo de descarbonização da matriz produtiva, do sistema produtivo e de inovação da saúde. O segundo é o fortalecimento da prevenção, que permita respostas antecipadas às grandes questões de saúde e, assim, pressione menos o meio ambiente pela produção de bens e insumos poluentes.

Pensar a transição a partir da descarbonização é um dos pontos centrais da nossa agenda. Temos um objetivo, que é descarbonizar o SUS até 2050. Então, quais são as estratégias que estamos avaliando para viabilizar isso, de acordo com o que o Felipe pontuou?

Estamos vendo que diante de grandes catástrofes, como uma emergência climática, nós ficamos muito vulnerabilizados. A pandemia mostrou isso. Faltaram ventiladores mecânicos para insuficiência respiratória durante a crise sanitária no Brasil.

Um dos aspectos centrais do CEIS é ter, na indústria local, a proteção da sua população

Protegemos o nosso povo quando desenvolvemos tecnologias em nosso país. Esse é o aspecto principal da inovação. Em caso de emergência, se temos inovação desenvolvida localmente, conseguimos atender a população. Por que o Brasil, a África, a América Latina ficaram tão vulneráveis, tendo que enfrentar tantos desafios? Porque dependiam de tecnologias. Se temos produção local, reduzimos drasticamente essa vulnerabilidade e protegemos o nosso povo. A economia deve estar a serviço da vida e do planeta, portanto um dos aspectos centrais do CEIS é ter, na indústria local, a proteção da sua população. Porque as mudanças climáticas, como o Felipe falou, estão muito relacionadas à saúde e as crises sanitárias também.

Quando aconteceu um pico de temperatura no EUA, atingindo 50 graus em 2021, os cabos de energia derreteram, prejudicando a transmissão de energia para os hospitais. Isso colocou em risco a vida das pessoas. Como lidar com desafios como esse, diante de temperaturas que vão chegar a 60 graus? Com ações de mitigação e adaptação, como produção de alimentos, regulação de microclimas, desenvolvimento de tecnologias, e a promoção de centros de ciência e tecnologia preparados para respostas a situações emergentes, como foi o caso das vacinas produzidas pelo Instituto Butantan e pela Fiocruz.

Investir no Complexo Econômico-Industrial da Saúde se trata, neste momento, de pensamento estratégico de desenvolvimento nacional, porque não estamos diante de um cenário simples, estamos diante de um futuro apontando para outras emergências sanitárias.

Como vocês definiriam o principal objetivo desse grupo de pesquisa?

Felipe:  Nosso objetivo é subsidiar a elaboração de políticas públicas para uma transição do Complexo Econômico-Industrial da Saúde que vise à sustentabilidade do SUS. E quando falamos de sustentabilidade, nos referimos à sustentabilidade do ponto de vista econômico, social e ambiental. Isso acaba se desdobrando em algumas ações mais específicas.

 Carolina: Nossa agenda tem alguns focos, que são as inovações, a questão da produção, a questão energética, a questão do emprego, a inclusão produtiva e a descarbonização. Mas o ponto principal dessa agenda é a descarbonização com desenvolvimento sustentável, a partir de uma economia a serviço da vida e do planeta.

Felipe: Além da descarbonização, outro ponto fundamental é a promoção do SUS como um meio e um fim para esse processo de transição. Nós nunca desassociamos o nosso trabalho da promoção do SUS.

Qual é a composição do grupo de pesquisa e como vocês, ao olharem para o futuro, avaliam os principais desafios em relação ao objeto de trabalho?

Carolina:  Somos cinco pesquisadores - Carlos A. Grabois Gadelha, Carolina da Silveira Bueno, Clarice Araújo Rodrigues, Felipe Kamia, Juliana Moreira e Camila R. Freitas. Um grupo multidisciplinar, composto por pessoas da área ambiental, da área hospitalar e economistas. É um desafio essa agenda que estamos estruturando, porque a questão climática a cada dia tem uma novidade. Trabalhamos com esses pontos centrais - a transição justa, o cuidado nos serviços em saúde, a sustentabilidade desses serviços e a descarbonização do sistema produtivo, que envolve energia, equipamentos e matéria-prima. Trabalhamos, também, com os aspectos sociais, que seria a questão do emprego.

Trazemos ainda o tema da biodiversidade como uma parte central nessa questão que você comentou anteriormente a respeito dos produtos de alto valor agregado. Porque a proteção da biodiversidade é a floresta em pé. A economia baseada nas plantas, os novos fármacos que virão desses estudos. Temos os laboratórios nacionais, instituições de pesquisas e teremos a mais complexa infraestrutura científica do país, com a construção do laboratório Orion e sua integração ao Sirius, no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), localizado em Campinas (SP).  

O Sírius é um aparelho de grande porte já em funcionamento, que usa um acelerador de partículas para produzir um tipo especial de luz, chamada luz síncrotron, utilizada na investigação da composição e da estrutura dos mais diversos materiais em micro e nanoescala. Já o Orion, previsto no Novo PAC, será um laboratório de segurança máxima NB4, o primeiro dessa classificação em toda a América Latina, que permitirá ao país monitorar, isolar e pesquisar os agentes patógenos, causadores de doenças graves e com alto grau de transmissibilidade, para o desenvolvimento de diagnóstico, vacinas e tratamentos. Únicos na América Latina, o Sirius é o segundo no mundo, agora já existem três. 

Nossa agenda passa por essas questões amplas. A nossa próxima publicação será sobre as assimetrias na inovação. Falamos da inovação verde e mostramos quem nessa transição, de fato, está produzindo ciência, quem se apropria do conhecimento. Para abordarmos essas questões, temos que mostrar como se dá a inovação no processo de transição. Estamos terminando esse estudo agora, mas a nossa intenção maior é olhar para as questões da sustentabilidade, da transição ecológica, pensar no desenvolvimento econômico nacional, tendo a saúde como um motor, um eixo.

Felipe: Celso Furtado expressou de diversas formas o que seria o desenvolvimento. Uma delas se relacionaria ao conhecimento. Ele falou que o desenvolvimento se dava quando uma sociedade conseguia reconhecer e trabalhar os problemas que a afetam, propondo soluções de forma autônoma. Por isso a questão do conhecimento é tão importante para o país, ainda mais com toda a riqueza da biodiversidade brasileira e a diversidade regional, cultural que temos.

Felipe e Carolina: Então, no fundo, o que precisamos é conseguir dar soluções para os nossos problemas. Para garantir que isso aconteça precisamos fortalecer nosso sistema produtivo de inovação, de forma a aproveitar essa riqueza presente em nossos biomas. A noção de desenvolvimento do Celso Furtado é muito boa para pensarmos a importância conhecimento nesse sentido.