Evento discute resiliência e adaptação climática no sistema de saúde como caminho para a justiça social

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Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS)

Evento discute resiliência e adaptação climática no sistema de saúde como caminho para a justiça social



POR Anna Durão

PUBLICADO 11/11/2025

O desenvolvimento de processos de planejamento, preparação e resposta à crise climática que já está impactando a infraestrutura da saúde esteve na pauta da 17ª edição do Seminário Hospitais Saudáveis (SHS 2024), realizado nos dias 29 e 30 de outubro de 2024 no Rio de Janeiro.

O evento foi uma iniciativa do projeto Hospitais Saudáveis (PHS), organização não governamental que mobiliza pessoas e instituições em prol da sustentabilidade na área da Saúde, pública e suplementar, em parceria com a Health Care Without Harm, que busca atuar mundialmente na assistência médica para a redução do dano ambiental, e com o Centro de Vigilância Sanitária de São Paulo.

Participaram da mesa de abertura o secretário executivo do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE-Fiocruz), Marco Nascimento, e a pesquisadora em Transição Ecológica do projeto Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS, um dos dez do Centro) e diretora de Atenção à Saúde do Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ, Clarice Araujo, ao lado de Eliete Bouskela (Associação Nacional de Medicina, ANM), Graccho Alvim Neto (Associação de Hospitais do Estado do Rio de Janeiro, AHERJ), Margareth Portella (Secretaria de Saúde do Estado do RJ) e Ronaldo Damião (Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Uerj).

A área da Saúde representa cerca de 5% das emissões globais de gases de efeito estufa, de acordo com a Health Care Without Harm, havendo variação desse índice em cada país. “No cenário da transformação climática, há um aumento da demanda por serviços de saúde. Doenças crônicas não transmissíveis, causadas pela poluição, e infeciosas emergentes, além dos resíduos hospitalares, são alguns dos fatores que requerem novas políticas não só descarbonização, mas também de fortalecimento da capacidade de resposta dos sistemas de saúde a eventos extremos e condições duradouras das mudanças climáticas, com ênfase em resiliência e adaptação”, explicou Clarice.

O SHS 2024 foi realizado em paralelo à reunião dos ministros da Saúde do G20, também no Rio de Janeiro. Atores importantes da área compareceram ao seminário, como a diretora do Departamento de Meio Ambiente, Mudança Climática e Saúde da OMS, Maria Neira, que ministrou a palestra magna A crise climática é uma crise de saúde: desafios e responsabilidades para os governos e as lideranças do setor saúde, no primeiro dia.

Mesa de abertura
O coordenador executivo do CEE-Fiocruz destacou que a transformação ecológica é um dos pilares do novo projeto de desenvolvimento nacional, referindo-se à segunda missão do programa Nova Indústria Brasil, que cita a construção da nova geração das políticas do CEIS. “As Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDP) e o Programa de Desenvolvimento e Inovação Local (PDIL) têm o fator ambiental e a transformação ecológica como critérios de seleção de projetos a serem contemplados com recursos. Isso é uma exortação à compreensão de que vocês estão fazendo de diferença”, disse ao elogiar a iniciativa do Projeto Hospitais Saudáveis.

Clarice Araujo alertou para o ponto de inflexão que atingimos e para o papel central da universidade ao capacitar as pessoas, bem como para a necessidade de se “criar a consciência de sociedade para que os novos líderes tenham a capacidade de implementar as ações que estão sendo discutidas e avançar nessa agenda”.

Para ela, é necessário promover uma mudança na grade de formação. “Precisamos atualizar o currículo dos profissionais de saúde, inserindo o tema da transição ecológica como disciplina obrigatória”, propôs Clarice, que defendeu recentemente na Ensp/Fiocruz a tese de doutorado O paradoxo da saúde: a base produtiva da saúde e o desenvolvimento sustentável, sobre as contradições presentes na base material da saúde.

Gestão na saúde
Clarice participou também da mesa O clima mudou: o que estão pensando e realizando as principais lideranças da Saúde, ao lado de Daniel Beltrammi (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, a EBSERH), Ingrid Cicca (Rede D’Or São Luiz), Marco Saavedra Bravo (Hospital Sírio-Libanês) e Rosane Ghedin (Hospital Santa Marcelina).

Diretora, pesquisadora e enfermeira por formação — Clarice trabalhou por dez anos em terapia intensiva —, ela abordou o processo de transição na gestão Complexo Hospitalar e da Saúde da UFRJ (CHS-UFRJ). Algumas unidades estão sendo geridas pela EBSERH e outras permaneceram sob a gestão da própria universidade.

“Ninguém esconde do que está doente quando vai a uma consulta médica; você tem que mostrar as suas mazelas para que o médico possa diagnosticar e fazer o tratamento adequado. Da mesma forma, a gente precisa fazer um diagnóstico das instituições e dos sistemas e unidades de Saúde, reconhecendo quais são as mazelas”

— Clarice Araujo

Entre as iniciativas citadas por ela como melhorias da gestão, está a formalização da política de sustentabilidade e de educação regenerativa da UFRJ, tendo à frente o professor Francisco de Assis Esteves, fundador do Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade (Nupem/UFRJ), conforme destacou Clarice. Ela celebrou a ação, que “vem sendo divulgada amplamente dentro da própria instituição, promovendo uma cultura para a sustentabilidade e de quebra de paradigma de ensino nas universidades”.

Clarice informou que está sendo criada a Câmara Técnica de Saúde para prevenção e resposta a desastres e emergências sanitárias, além do desenvolvimento de um Plano de Logística Sustentável, que estimula compras sustentáveis. “Criamos uma comissão de padronização, instituímos critérios de sustentabilidade. Mas alguns editais vieram vazios, porque não havia empresa já adequada ao critério que nós começamos a trabalhar naquele momento (…). O impacto de um edital zero é muito complicado para quem está na gestão de compras públicas”.

Diante dessa realidade, a própria UFRJ, ressaltou a diretora, vai desenvolver a sustentabilidade nas unidades de saúde, em integração com a política de sustentabilidade da universidade.


Complexo Econômico-Industrial da Saúde
A importância do CEIS integrado foi lembrada pela diretora: “Não há como ter serviços sem equipamento; a indústria de equipamentos depende da demanda dos serviços; assim como não há como ter o serviço e não ter o desenvolvimento de fármacos, vacinas. Por isso o Complexo Econômico-Industrial da Saúde tem relevância nacional”.

Clarice divulgou alguns indicadores do campo da Saúde, que representa 10% do PIB e gera em torno de 20 milhões de empregos diretos e indiretos, “promovendo renda, qualidade de vida e bem-estar social também”. No entanto, indicou, “o mesmo CEIS que está gerando todos esses benefícios e garantindo mais acesso à saúde pela população reproduz o modelo econômico global e suas contradições; (…) ao mesmo tempo em que oferece suporte para o atendimento à população, está colaborando com todas essas crises interconectadas”.

Clarice informou que, para reduzir esse impacto, o grupo de pesquisa em Transição Ecológica do projeto CEIS do CEE-Fiocruz que ela integra realiza colaborações técnicas com a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde do Ministério da Saúde (Sectics/MS), contribuindo para a transição ecológica do Complexo. “Uma transição por dentro da saúde, induzindo mudanças paradigmáticas nas trajetórias tecnológicas que já existem, permitindo uma economia circular, cíclica e sustentável”, definiu.

Os processos apresentados no evento, observou, devem, também, contribuir para a proposição de novas políticas públicas. “É muito importante esse trabalho que cada um de vocês está desenvolvendo nas suas unidades. E se tornará ainda melhor se estiver ancorado não só em uma política institucional, mas, também, em uma política pública que apoie e que incentive a continuidade das ações”.

Clarice alertou para “o cenário de múltiplas crises e de conflitos geopolíticos, que geram contextos complexos”, observando que a saúde está no eixo estratégico da discussão. “Os sistemas de saúde precisam estar preparados para garantir o acesso, “adaptando-se à nova realidade climática, mas, também, mitigando os impactos ambientais das suas operações”.

A diretora finalizou enaltecendo a importância da estruturação do SUS, “para haver resiliência, adaptação, mitigação e, principalmente, adaptação a esse momento de crise que estamos vivendo. Afinal, todos somos pacientes”.

Premiação
Marco e Clarice também fizeram entregas do prêmio Amigo do Meio Ambiente, voltado a organizações de saúde que se destacam por iniciativas de proteção ao meio ambiente e de sustentabilidade. Concorrem as organizações públicas ou privadas que prestam serviços de saúde no âmbito do SUS em todo o Brasil. A premiação visa estimular profissionais e dirigentes das unidades de saúde pública a desenvolverem uma cultura perene de preservação ambiental em suas organizações, adotando soluções mais efetivas e ecologicamente sustentáveis.

Assista na íntegra

– dia 29: https://www.youtube.com/watch?v=o_K-9RpHkAQ&t=1931s
– dia 30: https://www.youtube.com/watch?v=HOTeliLohOA&t=10s

Ao microfone a pesquisadora em Transição Ecológica do projeto Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS, um dos dez do Centro) e diretora de Atenção à Saúde do Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ, Clarice Araujo.

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