Seis meses da tragédia de Mariana: caravana recolhe denúncias, violações e propostas dos atingidos

Seis meses da tragédia de Mariana: caravana recolhe denúncias, violações e propostas dos atingidos

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As marcas da destruição em Mariana (MG), após rompimento de barragem de rejeitos da mineradora Samarco, subsidiária da Vale (foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

 

Seis meses após a tragédia de Mariana (MG), que teve o distrito de Bento Rodrigues varrido do mapa pelos rejeitos da barragem da mineradora Samarco (joint-venture formada pelas mineradoras Vale e BHP), rompida em 5 de novembro de 2015, há muito a esclarecer e muito a resolver em atenção às famílias atingidas. Que o diga a Caravana Territorial da Bacia do Rio Doce, que, entre 11 e 14 de abril de 2016 percorreu quatro rotas na região, para compreender e analisar os impactos daquilo que seus integrantes classificam de “tragédia-crime”.

Da experiência saiu uma detalhada Carta Política, assinada por 75 entidades, reunindo impressões e listando violações, denúncias, reinvindicações e propostas de encaminhamentos. O documento traz também anúncios, isto é, experiências positivas que emergiram da lama, graças à resiliência das comunidades e povos da região.

A Caravana, que terminou na cidade mineira de Governador Valadares, onde foram realizadas troca de experiências entre as rotas, mesa-redonda de debates, rodas culturais e um ato político, envolveu dezenas de organizações nacionais, regionais e locais, contou com a participação de cerca de 150 caravaneiros e caravaneiras e mais de mil pessoas nas inúmeras atividades realizadas. 

Que desenvolvimento é este que mata e destrói? Quem é quem neste modelo? Quais as alternativas para uma sociedade mais soberana e justa, que respeite a natureza, a cultura e o trabalho de homens e mulheres? Indagações como essas, registradas na Carta Política, orientaram todo o trabalho.

Veja aqui algumas das muitas violações e denúncias colhidas pela Caravana, bem como as reivindicações e propostas das populações atingidas.

Violações:
Destruição da natureza dos rios; destruição de vidas humanas, do patrimônio cultural material e imaterial; violação do direito à preservação da memória e identidade das comunidades e povos da Bacia do Rio Doce; deslocamentos compulsórios; violação dos direitos à moradia, ao trabalho e à informação; fragmentação de comunidades e violação do direito à organização popular; violação do direito à autodeterminação dos povos e comunidades tradicionais, à participação das comunidades e povos atingidos na tomada das decisões; violação do direito de acesso à água de qualidade, à saúde, à segurança e soberania alimentar; traumas psicológicos; violência física, sexual, psicológica e moral sobre as mulheres atingidas.

Denúncias
Racismo ambiental, com violência sobre populações negras e povos tradicionais; casos de estupro, aumento da violência contra as mulheres e prostituição nos municípios onde se concentram os trabalhadores das obras de contenção da Samarco/ Vale / BHP; não cumprimento pelas mineradoras de acordos preestabelecidos com os atingidos; cerceamento do acesso da população à informação, à participação e à decisão nos acordos e medidas; abandono de espaços de negociação coletiva, visando acordos individuais e desiguais; relato de coceiras na pele e processos alérgicos pela população abastecida com a água captada no Rio Doce; pescadores sem auxílio ou com auxílio de valor inferior ao que geravam com a pesca; pescadores pescando e se alimentando de peixes contaminados ou obrigados a modificar radicalmente os hábitos alimentares; contradição entre laudos técnicos de diferentes instituições e órgãos públicos; perda de lavouras e de patrimônio genético e contaminação de alimentos na região atingida; aumento das tarifas de água, e transmissão do custo do tratamento para os atingidos; retaliações e perseguições a lideranças da Bacia do Rio Doce.

Reivindicações/Encaminhamentos:
Interromper a captação de água do Rio Doce para o abastecimento dos municípios atingidos e garantir fontes de água alternativa e segura, com a retomada de obras como as adutoras em Colatina; laudos confiáveis que comprovem a real situação da água fornecida, sem interferência das empresas responsáveis pela tragédia-crime; acesso amplo e irrestrito às informações sobre os impactos da tragédia/crime e os encaminhamentos jurídicos; apuração da repressão policial e responsabilização pela violência cometida aos camponeses e camponesas do Assentamento do MST Sezínio Fernandes, em Linhares (ES); promoção de estudos e análises, de forma independente e com protagonismo das populações camponesas e ribeirinhas, sobre o potencial do Complexo Lagunar de Linhares como berçário reprodutor de espécies do Rio Doce; demarcação e/ou ampliação das terras indígenas, dos povos Krenak e Pataxó; auxílio emergencial a todos os atingidos da bacia, com reconhecimento da pluralidade desses sujeitos (pescadores, agricultores, ribeirinhos, comerciantes, mulheres etc.); participação das comunidades atingidas na construção do plano de reparação e recuperação, e na escolha do local onde serão realocadas; responsabilização criminal e punição da Samarco/Vale/BHP e das instituições públicas que têm atuado de acordo com os interesses da empresa e não das populações; revisão do acordo firmado entre os diferentes governos e a Samarco/Vale/BHP, com ampla participação da população, comunidades e povos impactados.

Anúncios:
Experiências de Educação Popular e Educação do Campo, que precisam ser fortalecidas e ampliadas; experiências de Economia Popular Solidária (cooperativismo, associativismo e auto-organização de grupos comunitários), que promovem segurança alimentar, geração de renda e autonomia das mulheres, respeitando características culturais e hábitos alimentares da região; experiências agroecológicas ao longo de toda a Bacia do Rio Doce, com manejo e preservação da agrobiodiversidade, práticas populares de cuidado em saúde, proteção e recuperação de nascentes, manejo ecológico dos solos, feiras da agricultura familiar, proteção e conservação das sementes, práticas de homeopatia, experiências de saneamento rural; resistência das comunidades, povos, grupos, organizações e coletivos frente às violações; protagonismo das mulheres em muitas das experiências de luta.

A íntegra dessas listagens está na Carta Política da Caravana Territorial da Bacia do Rio Doce.

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