Microcefalia: descriminalização do aborto volta ao debate
O aumento nos casos de microcefalia no Brasil reabriu o debate sobre aborto, já que a saúde física e mental das mulheres grávidas está em jogo. Nesse cenário, o grupo de advogados, acadêmicos e ativistas que articulou a discussão sobre a descriminalização do aborto de fetos anencéfalos no Supremo Tribunal Federal (STF), acatada em 2012, prepara uma ação similar pelo direito ao aborto em gestações de bebês com microcefalia.
À frente da proposta está a ativista e antropóloga do Instituto de Bioética Anis, Debora Diniz, que pretende garantir que a política pública de planejamento familiar ofereça acesso a métodos contraceptivos, proporcione ecografia com diagnóstico da microcefalia e dê a possibilidade da interrupção da gestação, caso essa seja a vontade da mulher.
O grupo que prepara a ação argumenta que a mulher não deve ser punida por uma falha das autoridades em controlar o mosquito transmissor da doença, Aedes aegypti, e que a ilegalidade do aborto e a falta de políticas de erradicação do Aedes ferem a Constituição Federal em dois pontos: direito à saúde e direito à seguridade social.
"Nós vivemos uma situação de epidemia e não podemos ter um ministro que diz que ‘perdemos a guerra contra o mosquito' (em referência à declaração do ministro da Saúde, Marcelo Castro, em 22/1). Não, a guerra tem que ser ganha. Essa responsabilidade não é da mulher. Isso é negligência do Estado e gera uma responsabilidade do Estado", afirma Diniz, também professora na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília à BBC Brasil.
Os casos de microcefalia levaram a Organização Mundial da Saúde (OMS) a decretar, em 1º/2, estado de emergência de saúde pública internacional, conforme declaração da diretora geral, Margaret Chan, em uma coletiva de imprensa. Apesar de ainda não haver prova científica de que o zika seja a principal causa do aumento de casos de microcefalia, Chan enfatizou a importância de as medidas preventivas serem tomadas desde já.
A legislação brasileira só permite o aborto em casos de estupro, risco de vida da mulher, além dos casos de anencefalia. Segundo pesquisa Datafolha divulgada em dezembro de 2015, 67% dos brasileiros são favoráveis à manutenção da lei. Outros 16% acreditam que o aborto deve ser permitido em outros casos e 11% acreditam que a prática deveria deixar de ser crime em qualquer situação.
O Brasil notificou em maio de 2015 o primeiro caso da doença pelo vírus zika e fez alerta em outubro sobre o número elevado de nascimentos de crianças com microcefalia na região Nordeste. Desde então, há 270 casos confirmados e 3.449 em estudo, contra 147 em 2014.
O país é atualmente o mais atingido pelo vírus, seguido pela Colômbia, que anunciou mais de 20 mil casos, 2 mil deles, em mulheres grávidas. A Colômbia aconselhou as mulheres a adiarem a gravidez por seis a oito meses. Alertas similares foram feitos no Equador, El Salvador, Jamaica e Porto Rico.