Brasil tem a segunda maior concentração de renda do mundo, diz relatório da ONU
O Brasil está em segundo lugar entre os países com mais concentração de renda, atrás apenas do Catar, quando analisados os 1% mais ricos, aponta o Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) – Além da renda, além das médias, além do hoje: desigualdades no desenvolvimento humano no século 21, das Nações Unidas, divulgado em 9/12/2019. Esse 1% mais rico concentra 28,3%, ou quase um terço da renda total do país (29%, no Catar). Se o cálculo considerar os 10% mais ricos a concentração é de 41,9% da renda total.
O relatório mostra, ainda, que o Brasil caiu uma posição na lista de países classificados no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), passando de 78ª para a 79ª posição no ranking de 189 países, na comparação com 2017. O país, de qualquer forma, situa-se entre os países de alto IDH – há, ainda os grupos de muito alto IDH, médio IDH e baixo IDH. Na América do Sul, é o quarto país com maior IDH, ficando atrás de Chile, Argentina e Uruguai. O Índice de Desenvolvimento Humano mede o progresso de uma nação a partir de três dimensões: renda, saúde e educação. Vai de zero a um: quanto mais próximo de um, maior o desenvolvimento humano.
Com o IDH de 0,761, o Brasil fica em 79º no mundo e em 4º na América do Sul —nas duas posições, o país fica empatado com a Colômbia. Embora o IDH brasileiro de 0,761 em 2018, tenha representado leve aumento de 0,001 ponto na comparação com 2017, o país caiu no ranking geral, porque outros países avançaram mais rapidamente.
O relatório destacou que o índice de concentração de renda de mais de 40% entre os 10% mais ricos fica ainda maior, quando consideradas todas as formas de renda, não apenas as reportadas nas pesquisas domiciliares: as estimativas sugerem que os 10% mais ricos de fato concentram 55% do total da renda do país (página 107 do relatório, em inglês). Além do Brasil, altos índices de desigualdade também estão presentes na África Subsaariana e no Oriente Médio, aponta o documento.
No Brasil, a renda dos 40% mais pobres cresceu 14 pontos percentuais acima da média, entre 2000 e 2018, indicou, ainda, o relatório. Contudo, o 1% mais rico também viu um crescimento mais forte que a média brasileira. Uma vez que todos os grupos não podem crescer mais do que a média, isso significou que os grupos de renda média (entre os 40% mais pobres e o 1% mais rico) tiveram crescimento menor da renda.
Acesse o relatório completo (em inglês) e resumido (em inglês e espanhol)
O documento mostrou ainda que o mundo alcançou ganhos substanciais nos níveis básicos de saúde, educação e padrão de vida. No entanto, as necessidades de muitas pessoas permanecem não atendidas e, paralelamente, uma próxima geração de desigualdades se inicia, colocando as pessoas ricas à frente no desenvolvimento.
O relatório analisou a desigualdade em três aspectos: além da renda, além das médias e além do hoje, propondo diversas recomendações de políticas públicas para superá-la. “Propomos que as políticas de combate à desigualdade devem ir além da renda, focalizando também em intervenções ao longo da vida, em esferas como saúde e educação, e começando antes mesmo do nascimento”, declarou a representante residente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no Brasil, Katyna Argueta, no site das Nações Unidas.
Para o PNUD, as desigualdades entre os grupos populacionais, em diferente locais e ao longo do tempo, também devem ser observadas. As desigualdades atuais e as novas deverão interagir no futuro com as principais forças sociais, econômicas e ambientais para determinar a vida dos jovens de hoje e das futuras gerações.
Uma próxima geração de desigualdades se inicia, colocando as pessoas ricas à frente no desenvolvimento.
Segundo o relatório, as condições de partida podem determinar os avanços que uma pessoa consegue alcançar ao longo de sua vida.
As desigualdades nas capacidades básicas – ligadas às privações mais extremas – estão diminuindo. Ao mesmo tempo, as desigualdades estão aumentando no que diz respeito a capacidades avançadas – refletindo aspectos da vida que provavelmente se tornarão mais importantes no futuro, porque serão mais empoderadores. As pessoas empoderadas hoje parecem mais preparadas para avançar ainda mais amanhã.
A proporção da população adulta com ensino superior, por exemplo, está crescendo seis vezes mais rápido em países com desenvolvimento humano muito alto que em países com baixo desenvolvimento humano. As assinaturas de banda larga fixa estão crescendo 15 vezes mais rápido nos países de desenvolvimento humano muito alto, enquanto para os países de baixo desenvolvimento, o serviço não chega a atender 1% da população.
Os avanços tecnológicos [dos países] não estão favorecendo a sociedade igualitariamente. Pessoas com capacidades avançadas se beneficiam mais dos progressos tecnológicos, e isso pode lançar os ricos ainda mais à frente no futuro
Os desafios da mudança do clima e das transformações tecnológicas são duas forças que moldarão o desenvolvimento humano no próximo século. Os mais pobres estão mais vulneráveis aos impactos da mudança do clima e terão mais dificuldades para superá-los.
Ao mesmo tempo, os avanços tecnológicos não estão favorecendo a sociedade igualitariamente. Pessoas com capacidades avançadas se beneficiam mais dos progressos tecnológicos, e isso pode lançar os ricos ainda mais à frente no futuro.
No acesso à tecnologia, por exemplo, os países em desenvolvimento possuem 67 assinaturas de telefonia móvel por 100 habitantes, metade do número de países de desenvolvimento humano muito alto. Investimentos em pesquisa e tecnologia têm elevado impacto na produtividade e no crescimento econômico.
Segundo o relatório, o Brasil apresenta bons resultados nesse ponto: dirigiu cerca de 1,3% do PIB a investimentos nessas duas áreas nos últimos anos, equiparando-se a países desenvolvidos como a Irlanda (3º melhor IDH do mundo), Itália, Portugal, Nova Zelândia e Canadá, com gastos entre 1,2% e 1,5% do PIB. Esse resultado também coloca o país à frente de todos da América Latina.
O Relatório de 2019 faz um chamado para a ação e recomenda políticas públicas que podem apoiar os governos de todo o mundo no combate às novas e variadas formas de desigualdade, para além da renda.
Políticas antitruste, por exemplo, auxiliam os países a progredir em equidade e eficiência ao mesmo tempo. Elas restringem a capacidade das empresas, nivelando o campo de atuação e aumentando a eficiência, e levam a resultados mais equitativos, reduzindo a concentração da renda.
O caminho é fortalecer o arcabouço regulatório, garantindo o funcionamento do mercado concorrencial. Tais medidas contribuem para a redução da pobreza e para impulsionar o crescimento e a produtividade.
A promoção do desenvolvimento na primeira infância tem papel importante para garantir boas condições de partida, logo nos primeiros anos de vida das pessoas. Instalar uma estrutura política abrangente com diretrizes, ferramentas e padrões nacionais, envolvendo os principais atores (pais, famílias e instituições educacionais) na tomada de decisão, é uma das recomendações do relatório.
* Com informações do site das Nações Unidas, de O Globo e da Revista Fórum. Relatório divulgado em 9/12/2019.