Da meta à ação: cenários para a integração de políticas
Ações políticas em prol do acesso à saúde e ao bem-estar foram tema das exposições trazidas à mesa Da meta à ação: como integrar as políticas?, no segundo dia do 9º Simpósio Nacional de Ciência, Tecnologia e Assistência Farmacêutica, em 16/9/2022. A mesa reuniu o vice-presidente da Abrasco, Reinaldo Guimarães; a representante da Associação Nacional em Apoio e Defesa dos Direitos das Vítimas da Covid-19 Vida & Justiça, Rosângela Dornelles; o presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (Abifina), Antônio Carlos da Costa Bezerra; e a professora do Departamento de Políticas e Instituições de Saúde IMS/ Uerj Marilena Corrêa.
Reinaldo Guimarães destacou as políticas industriais que se mostraram relevantes ao longo do tempo para ampliação do acesso à saúde no país e ressaltou a importância da aproximação entre atores e intuições. "A Política de Desenvolvimento Produtivo construiu uma integração de atores da indústria privada, laboratórios oficiais e órgãos oficiais e de um conjunto de instituições públicas importantes para a constituição de uma política industrial voltada à ampliação de acesso, amalgamada no Grupo Executivo do Complexo Industrial da Saúde, o Gecis, que agora está praticamente extinto”, observou.
De acordo com Reinaldo, ainda, a Política de Desenvolvimento Produtivo deveria estar mais integrada à política industrial brasileira. “Se não tivermos um projeto nacional de política industrial não conseguiremos ter um avanço setorial da política industrial no campo da saúde. Para isso, o papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é absolutamente fundamental”.
Outra política importante destacada por Reinaldo Guimarães foi a volta da avaliação e incorporação de tecnologia, que teve “grande avanço” entre 2007 e 2011, quando foi criada a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec). “Tem fragilidade, tem conflito de interesses, mas foi um avanço muito grande sobre a política de incorporação de tecnologias no SUS”, avaliou.
O pesquisador destacou também a relevância das políticas de controle de preços de medicamentos, por “fazer com que a trajetória de preços de medicamentos no Brasil seja contracíclica”; da vigilância sanitária, que “tem papel importante na construção da política industrial para ampliação do acesso e saúde”; e da propriedade intelectual. “Esse conjunto de políticas tem que ter uma integração mais orgânica no Ministério da Saúde. Todas elas podem contribuir para uma política industrial mais robusta que atenda aos interesses do SUS”, concluiu.
Em sua exposição, a pesquisadora Rosângela Dornelles destacou os desafios trazidos pela pandemia e ressaltou a importância de se rediscutir e integrar ações políticas em prol do bem-estar social. “Ficou claro nas discussões aqui que os interesses privados vêm, há muitos anos, à frente dos interesses da sociedade brasileira, e esse é nosso grande desafio é quebrar tabus e conseguir fazer a integração necessária”, considerou.
Dornelles explicou, ainda, que a iniciativa de se criar uma associação nacional voltada ao enfrentamento da Covid-19, que pudesse dar apoio, fazer reparação e colocar as vítimas da Covid em pauta, defrontou-se exatamente com o cenário de sindemia – relativo a problemas de saúde que se interligam e aumentam uns aos outros e afetam o estado geral de saúde de uma população, em condições sociais adversas. “Precisamos de uma economia que coloque vulnerabilidade e exclusão à frente, inclusive, no sistema de proteção social”, propôs.
A pesquisadora chamou atenção também para a necessidade de uma estrutura de dados que viabilize a gestão de informações, em especial, as referentes à pandemia de Covid-19. “Não temos, por exemplo, um sistema que nos diga, hoje, quantas são as pessoas sequeladas pela Covid-19 no Brasil”, apontou.
Dornelles concluiu destacando a necessidade de uma “comunicação dialógica”, com ênfase no território, buscando-se alcançar a transversalidade e a articulação entre academia e o que se constrói nos movimentos sociais. “É no território que aprendemos a fazer saúde”.
O pesquisador Antônio Carlos Bezerra trouxe ao debate a vocação da Abifina, desde sua criação, há 36 anos. “No seu DNA básico está a produção local e a propriedade intelectual, os dois grandes alicerces da Abifina”, definiu, lembrando que a associação congrega laboratórios privados e públicos de capital nacional, entre eles, Farmanguinhos, Bio-Manguinhos e o Instituto Vital Brasil.
Ele destacou ainda a vulnerabilidade do país no que diz respeito à demanda de assistência farmacêutica. “Não temos sequer uma planta para fabricação de antibióticos e, para retomarmos isso, são necessários de cinco a sete anos. Essa é a realidade da nossa dependência, e reflete a necessidade de uma integração de políticas para que possamos avançar”.
Bezerra lembrou da vitória obtida em 2022 em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, de 2013, para derrubar o parágrafo da lei de propriedade intelectual brasileira, que tratava da extensão indevida da validade das patentes. “As empresas transnacionais estão desafiando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Já existem quarenta pedidos de concessão por mais dez anos de proteção patentária. A cada pedido, estamos lutando pela derrubada, com base na decisão do STF”, relatou.
O pesquisador concluiu chamando atenção para a sintonia da Abifina com as discussões do Simpósio. “O complexo da química fina, o complexo industrial da saúde, a propriedade intelectual e a política sanitária convergem nos resultados deste evento”.
Por fim, a professora Marilena Corrêa fechou a mesa, ressaltando a proposta do Projeto Integra de promover a integração de políticas de saúde e enfrentar a questão da produção local de bens de saúde para o SUS. “Só dá para pensar em produzir localmente para os usuários do SUS, integrando as políticas públicas de ciência, de tecnologia, de propriedade intelectual”, apontou.
A professora destacou o papel das instituições de pesquisa na rápida capacidade de resposta em meio às dificuldades da pandemia de Covid-19. “Mesmo com toda dificuldade, em termos de gestão da pandemia, instituições como Bio-Manguinhos não deixaram de responder de alguma forma”, considerou Marilena. “Institutos de pesquisas, universidades e instâncias sociais mostraram que, se necessário, poderemos dar uma resposta ainda mais forte”.
Assista à mesa ‘Da meta à ação: como integrar políticas’
Leia sobre a mesa de abertura do 9º Simpósio Nacional de Ciência, Tecnologia e Assistência Farmacêutica
Leia sobre a mesa Panorama atual das Políticas de Assistência Farmacêutica, de Vigilância em Saúde e de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde
Leia a íntegra da 'Carta do Rio de Janeiro'