“Brasil deve investir no fortalecimento de um ecossistema científico e tecnológico” - Roberto Lent no CEE Podcast
“Os países que não têm ciência não têm desenvolvimento nem bem-estar”, avalia o neurocientista Roberto Lent, destacando ainda o papel da divulgação científica como uma forma de ampliar a interação da ciência com a sociedade. “É preciso divulgação científica para que as crianças apoiem a ciência e compreendam que ela é fundamental para a saúde, educação, indústria e agricultura”, diz Lent, que considera a atividade uma forma de incentivo à formação de futuros cientistas e de construção do próprio conceito de cidadania.
Professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, pesquisador do Instituto D´Or de Ensino e Pesquisa e membro titular da Academia Brasileira de Ciências, Lent tem uma longa trajetória dedicada à divulgação científica. Publicou diversos livros infantojuvenis sobre neurociência, foi um dos fundadores da primeira revista de divulgação científica do país, a Ciência Hoje, que neste ano está completando 40 anos, e assina uma coluna no jornal O Globo.
“A divulgação científica é uma espécie de oxigênio que precisa estar sempre no ar de uma sociedade”, afirma o pesquisador, explicando que ela contribui para que ampliar a compreensão das pessoas sobre o que a ciência consegue produzir, como consegue produzir e qual é o papel dos cientistas.
Lent destaca três formas de interação da ciência com a sociedade. Construída fora do campo educacional, a divulgação científica é uma delas e pode ser feita por diversos meios, explica, utilizando, por exemplo, televisão, jogos, livros, peças de teatro e filmes.
Outra maneira da ciência se relacionar com a sociedade, continua Lent, é por meio da educação para a ciência. Embora tenha uma interface muito grande com a divulgação científica, ele explica que a educação para a ciência se diferencia por estar incorporada nos procedimentos escolares e ocorrer de forma mais metodológica, estudada e controlada.
A terceira vertente dessa relação da ciência com a sociedade é a ciência para a educação, que, de acordo com o pesquisador, possibilita basear as intervenções educacionais em evidências científicas, desvendando como se dá o processo de aprendizagem. “A ciência tem muito a dizer sobre isso, mostrando, por exemplo, como é que o cérebro aprende, o que favorece a aprendizagem de uma criança ou de um adolescente e o que não favorece”, explica o pesquisador.
Roberto Lent lembra que existem várias maneiras de atrair as crianças para a ciência, citando, por exemplo os procedimentos mãos na massa que permitem trabalhar o interesse lúdico delas pela atividade científica. “As crianças precisam experimentar e curtirem a ciência quase como uma brincadeira, algo que lhes dê prazer”, diz o pesquisador.
Para isso, ele explica, que a educação para a ciência deve estimular a curiosidade. “Se partirmos da curiosidade delas e estimulá-la, vamos atraí-las para a ciência muito mais do que se fizermos um currículo rígido”. O smartphone pode ter um bom uso na educação, considera Lent, lembrando que é possível criar aplicativos muito lúdicos, divertidos e com conteúdo científico bastante atraente para essa ferramenta, que as crianças gostam tanto de usar.
Em sua avaliação, outras tecnologias digitais podem ser utilizadas com a mesma finalidade. Entretanto, ele pontua que o uso dessas novas tecnologias não deve extrapolar o limite do que é saudável. “Se uma criança adora ler e passa oito horas por dia deitada na cama lendo, mesmo que seja um livro, isso não será bom. A criança precisa brincar, conhecer outras crianças, fazer exercícios físicos”, avalia.
De acordo com o pesquisador, a utilização dos meios digitais na educação vem sendo estudada em várias linhas de pesquisa na neurociência, na psicologia e na pedagogia. “Existem muitos dados sobre o uso abusivo do smartphone, mas a gente não pode condená-lo por si próprio. Ele é apenas um instrumento, temos que saber utilizá-lo da forma mais adequada possível, baseando-se em evidências (científicas)”, afirma. Lent refere-se a estudos que apontam que as crianças devem usar o smartphone por no máximo três horas e que, acima de seis horas, já se pode considerar um vício. “Nesse intervalo entre 3 e 6 horas, a criança está na transição entre o limite tolerável de uso saudável do smartphone e a adicção”.
O pesquisador explica que a aprendizagem tem um forte base na memória e esta é influenciada pelas emoções. “Tendemos a lembrar melhor daquilo que está associado a emoções positivas. Aquilo que nos dá prazer, que nos faz feliz, e as crianças são assim também. Tendem a esquecer, até mesmo a bloquear aquilo que as fazem infelizes, que causa estresse”. Por isso, principalmente em situação de vulnerabilidade social, onde coexistem várias formas de violência, ele defende o turno integral para a educação como forma da escola oferecer proteção e suporte emocional, além de alimentação e contato com outras crianças.
Para Lent o país deve investir no fortalecimento de um “ecossistema científico e tecnológico” a fim de conquistar sua própria “libertação econômica e social”. Do contrário, ele avalia que o Brasil será eternamente exportador de grãos, dependendo de terras e de tecn