PEC contra o aborto: inconstitucional, discriminatória e risco à vida da mulher
Desarquivada em fevereiro deste ano, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 29/2015, que impõe a “inviolabilidade da vida desde a concepção”, está em tramitação no Senado. Se aprovado, o texto pode provocar retrocessos graves nos direitos reprodutivos das mulheres. A medida criminaliza o aborto em casos de estupro e dificulta o procedimento em caso de anencefalia, autorizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2012. A juíza Simone Nacif, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e a coordenadora Maria Helena Barros, do Departamento de Direitos Humanos e Saúde da Ensp/Fiocruz, falaram ao blog do CEE-Fiocruz sobre a inconstitucionalidade da PEC e os riscos que traz à vida da mulher. “A emenda viola o princípio de vedação ao retrocesso”, afirma Simone. “Pelo sistema jurídico constitucional, o direito humano não retrocede”, explica. “Estamos diante de um enorme retrocesso”, completa Maria Helena. “Mulheres que não tem acesso já sofrem e morrem de forma desigual por causa do aborto”, pontua.
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Dados da Pesquisa Nacional de aborto de 2016 mostram que o aborto não deixa de ser realizado pelas mulheres apesar da proibição. Para juíza Simone Nacif, a PEC 29/2015 pode trazer consequências sérias para saúde pública. “O aborto não vai deixar de ser feito, essa lei traz um risco concreto de negação de saúde pública e vem junto com um movimento de conservadorismo que está infiltrado nos parlamentares”, observa. Além disso, segundo a Juíza, essa PEC não é constitucional. “A partir do momento que o nosso sistema jurídico-constitucional estabelece e reconhece um direito humano, inclusive, sobre os direitos reprodutivos das mulheres e sobre o acesso à saúde pública, reduzir esses direitos é inconstitucional. Portanto, a luta pela descriminalização do aborto ou a manutenção do direito já existente e reconhecido na nossa legislação, é uma luta pela vida das mulheres”, conclui.
A partir do momento que o nosso sistema jurídico-constitucional estabelece e reconhece um direito humano, inclusive, sobre os direitos reprodutivos das mulheres, reduzir esses direitos é inconstitucional (Simone Nacif)
A pesquisadora Maria Helena Barros teme retrocessos, “o Supremo Tribunal Federal em uma audiência pública ano passado (2018) discutiu a descriminalização do aborto, voltarmos a falar em criminaliza-lo nos coloca diante de um retrocesso sem precedentes”, avalia. “Isso prejudica muito nossa democracia, uma vez que, a maior parte da população, que são de mulheres, não tem reconhecidos seus direitos reprodutivos”, destaca.
Muitas mulheres morrem por não terem o devido atendimento, morrem com infecções generalizadas. São mulheres que acabam morrendo por falta de condição (Maria Helena Barros)
Segundo a pesquisadora o aborto se dá em todas as classes e ocorre de forma vertical, mas infelizmente, pessoas que têm menos condições, também têm menos acesso aos serviços, e é exatamente aí que está localizado o maior número de mortes, explica. “Muitas mulheres morrem por não terem o devido atendimento, morrem com infecções generalizadas, o que é um absurdo. São mulheres jovens que estão na idade reprodutiva e que acabam morrendo por falta de condição”, lamenta.
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