O Ministério da Saúde e o PNI | Trajetórias, balanço e perspectivas

O Ministério da Saúde e o PNI | Trajetórias, balanço e perspectivas

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A Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz) lançou a série de artigos O Ministério da Saúde e o PNI, que oferece um panorama da política de saúde do país tendo como foco o Programa Nacional de Imunizações (PNI), criado em 1973, e sua articulação com o ministério, nascido vinte anos antes, como indica o artigo a seguir, que abriu a série. Os 70 anos do Ministério da Saúde e os 50 do PNI, celebrados em 2023, ao lado de análises sobre saúde indígena, desigualdade racial, epidemia de Aids, política nacional de atenção básica, Reforma Sanitária e formulação do SUS são temas abordados nos oito textos publicados até o momento e que podem ser acessados pelos links ao final do artigo.

Mãos seguram uma seringa inserida em um frasco de vacina

O Ministério da Saúde e o PNI | Trajetórias, balanço e perspectivas

Carlos Henrique Assunção Paiva​ (COC/Fiocruz)*

 
 

As décadas seguintes ao fim da Segunda Guerra Mundial foram marcadas por profundas mudanças na forma de se pensar o conceito, as práticas, as ações e as políticas de saúde no Brasil e em boa parte do planeta. As transformações e a velocidade dos ventos de mudança ensejaram diferentes experiências institucionais em âmbito local, nacional e internacional, bem como se articularam com a criação ou a reorganização de diversas instituições de saúde que teriam longa vigência (Pires-Alves; Paiva; Falleiros, 2010). Como partes desse contexto, marcado por um conjunto mais ou menos diferenciado de inovações, no dia 25 de julho de 1953, era criado o Ministério da Saúde; cerca de vinte anos depois, no dia 18 de setembro de 1973, era também criado o Programa Nacional de Imunizações (PNI) em nosso país. Ambas as instituições fazem, em 2023, aniversários de respectivamente 70 e 50 anos. Se, de um lado, os anos acumulados dão vistas à maturidade institucional conquistada por décadas de serviços prestados ao povo brasileiro, de outro, especialmente nos últimos anos, esse mesmo acúmulo se viu frontalmente testado pelos desafios colocados pela pandemia de Covid-19, e também pelas incertezas e instabilidades do cenário político-institucional nacional.

À trajetória dessas duas instituições se articularam sempre diferentes ideias, perspectivas doutrinárias, movimentos intelectuais, ações e políticas. Não se pode dizer que haja, ao longo do tempo, uma coerência ou uma integração coerente entre essas diferentes dimensões. Nos seus 70 anos de vida, por exemplo, o Ministério da Saúde foi palco de diversos movimentos que, sob a condução de distintos atores, ora orientaram a ação ministerial com vistas ao fortalecimento de políticas de tom mais liberal – e por que não dizer, privatizante –, ora imprimiram orientações que consideravam um papel de maior protagonismo do Estado na oferta e garantia de acesso aos serviços de saúde.

Instâncias como o Ministério da Saúde foram e são organismos de observação privilegiada das disputas entre projetos para a saúde pública brasileira, quiçá para o modelo de desenvolvimento do país

De um ponto a outro do espectro político-ideológico, uma gradação de diferentes tonalidades que, ainda que possam se apresentar como contradições, dizem respeito à riqueza de disputas de ideias e de orientações doutrinárias para as políticas no interior da burocracia pública. Ou seja, instâncias como o Ministério da Saúde foram e são organismos de observação privilegiada das disputas entre projetos para a saúde pública brasileira, quiçá para o modelo de desenvolvimento do país. Em que pesem as suas importantes peculiaridades, o mesmo pode ser dito com relação à trajetória dos 50 anos do PNI.

No contexto em que registramos índices de morbimortalidade de Covid-19 em queda constante e, ao mesmo tempo, somos capazes de ver, por parte das autoridades sanitárias, ações de comunicação pública e de imunização coletiva alinhadas às boas práticas de gestão política do Sistema Único de Saúde (SUS), análises críticas das trajetórias dessas importantes instituições da saúde do nosso país tornam-se imprescindíveis. É sob esse espírito que apresentamos a série especial que se debruça, em perspectiva histórica, sobre a trajetória do Ministério da Saúde e do Programa Nacional de Imunizações. Trajetórias decenais, constituídas por ideias e atividades tão complexas, exigem por parte dos analistas distinções que diferenciem elementos mais transitórios daqueles mais estruturantes, com implicações mais duradouras para a vida das instituições e a vigência de suas políticas. Considerando os problemas e desafios postos em nossos dias, os últimos elementos devem nos interessar mais que os primeiros.

Nesta série, abordaremos temas que dizem respeito ao processo de criação e formulação de ambas as instituições, conectando tais processos às ideias e experiências institucionais anteriores e aos seus respectivos contextos sanitários, sociais e políticos imediatos. Dessa forma, acreditamos contribuir para uma perspectiva menos burocrática ou mesmo voluntarista do processo de criação de aparatos estatais em favor de leituras que valorizam a ação coletiva, bem como a rede de elementos político-institucionais associados e vigentes em seus devidos contextos. Visitaremos, ainda, algumas das ações e políticas mais estruturantes, como a erradicação da poliomielite ou mesmo, por parte do Ministério da Saúde, o enfrentamento da epidemia de Aids. Essas ações e políticas, somadas a outras consideradas nesta série, representam marcos nas trajetórias das instituições aqui em exame e são partes fundamentais da própria história da saúde pública brasileira.

Também estarão sob análise iniciativas e temas que representam respostas e desafios ao poder público, como são os casos das ações e políticas voltadas para os problemas de saúde mais prevalentes, no terreno das doenças infectocontagiosas e das condições crônicas, bem como as agendas sanitárias mais focalizadas, como saúde da mulher, da população negra, das comunidades indígenas etc. O conjunto dessas iniciativas, como sabemos, se articula doutrinária e institucionalmente ao SUS, de modo que caberá um exame acerca do papel do Ministério da Saúde e do Programa Nacional de Imunização no seu funcionamento e fortalecimento.

Compõem esta série textos de pesquisadoras e pesquisadores de diferentes lugares institucionais, o que nos permite leituras a partir de distintas perspectivas e abordagens. Nas próximas semanas, será possível acompanhar a série especial em duas publicações semanais no website da Casa de Oswaldo Cruz, às segundas e quintas-feiras. Convidamos a todas e todos para nos acompanhar e assim refletirmos juntos sobre os horizontes colocados para a gestão e as políticas de saúde pública em nosso país a partir dos protagonismos tanto do Ministério da Saúde quanto do seu Programa Nacional de Imunização.
 

*Carlos Henrique Assunção Paiva​ é pesquisador do Observatório História e Saúde (Depes/COC/Fiocruz) e professor do PPGHCS/COC/Fiocruz. Publicado em 31/07/2023, no site da Casa de Oswaldo Cruz.

Referência:

PIRES-ALVES, Fernando A.; PAIVA, Carlos Henrique Assunção; FALLEIROS Ialê. Saúde e desenvolvimento: a agenda do pós-guerra. In: Carlos Fidelis Ponte; Ialê Faleiros (Orgs.). Na corda bamba de sombrinha: a saúde no fio da história. Rio de Janeiro: Fiocruz/COC; Fiocruz/EPSJV, 2010.

 

Confira abaixo os textos da série:

O Ministério da Saúde: 70 anos - Cristina Fonseca e Wanda Hamilton​ (COC/Fiocruz)
As ações de vigilância e imunização nos anos 1970 e a criação do PNI - Anna Beatriz de Sá Almeida​ (COC/Fiocruz)
O contexto da Reforma Sanitária e a formulação do SUS - José Roberto Franco Reis​ (COC/Fiocruz)
O enfrentamento da epidemia de Aids no Brasil - Eliza da Silva Vianna​ (Ifal)
A construção da Política Nacional de Atenção Básica - Márcia Valéria Morosini (EPSJV/Fiocruz)​
A cor da desigualdade: a Política de Saúde da População Negra - Roseli da Fonseca Rocha​​ (IFF/Fiocruz)​