Larvicida biológico oferece resposta rápida no combate à dengue
O biolarvicida DengueTech é mais uma contribuição da ciência e da tecnologia para o combate à dengue disponível no Brasil. “O produto é capaz de matar as larvas do mosquito Aedes aegypti em poucas horas, sem oferecer risco à saúde humana e ao meio ambiente”, destaca o engenheiro Rodrigo Perez, diretor da empresa BR3, responsável por sua produção.
Com tecnologia desenvolvida pela Fiocruz, o larvicida tem como princípio ativo a bactéria Bacillus thuringiensis israelensis (também chamada de BTI), encontrada na natureza. “Essa bactéria está presente no barro. Se formos analisar, 15% do que está no barro são bacilos. O BTI é um desses bacilos, que fica nesse ambiente e que foi prospectado pela equipe do professor Leon Rabinovitch”, explica Perez.
Em 2010, a empresa BR3 participou de uma chamada pública e foi selecionada para um acordo de cooperação técnica com a Fiocruz. O acordo envolvia a transferência de tecnologia desenvolvida pela engenheira bioquímica Elizabeth Sanches e sua equipe do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz) e resultou na formulação do larvicida DengueTech em tabletes.
No final de 2015, a empresa obteve a primeira autorização da Anvisa para a comercialização. “Em 2016, durante a epidemia brasileira causada pelo Zika vírus, nos organizamos para produzir, mas a comercialização, de fato, começou em 2017-2018”, lembra Perez. Desde então a empresa vem atendendo tanto a demandas de pessoas físicas como de empresas envolvidas com o tema, tais como empresas que trabalham com controle de pragas e outras que administram condomínios.
A ideia de usar BTI, porém, não é nova, salienta Perez, mas o know-how da formulação, desenvolvido em Farmanguinhos, foi o que permitiu aumentar sua vida útil e tornar sua aplicação em campo mais eficaz.
O que diferencia o Dengue Tech em relação a outros larvicidas é a formulação de um produto biológico. “O que a gente comercializa são esporos de BTI e proteínas que essa bactéria produz. E isso, por si só, já tem um grande diferencial em relação aos (outros) larvicidas que são produtos químicos, mais agressivos ao homem e ao meio ambiente”, explica o engenheiro.
Outra vantagem do emprego do BTI, continua Perez, é que ele tem em sua composição vários compostos que individualmente são letais para a larva, dessa forma o mosquito não consegue desenvolver resistência a todas elas juntas. “Quando ele quebra a resistência a uma das proteínas, não quebra a duas, três, quatro simultaneamente”, diz.
O BTI já foi usado “massivamente na Flórida, por meio de pulverização espacial” e “não houve relato de resistência do mosquito Aedes ao BTI e nem de impacto ambiental”, explica Perez. Na África, o engenheiro destaca que o produto já foi usado com sucesso em um programa de erradicação da oncocercose, doença parasitária crônica conhecida popularmente como cegueira dos rios ou mal do garimpeiro, transmitida pela picada do inseto Simulium (borrachudo ou pium) infectado com larvas do parasita nematódeo Onchocerca volvulus. No Brasil, foi pensado para o controle do mosquito Aedes aegypti.
O modo de usar é muito simples, garante Perez. “Qualquer um (pode) atender ao chamado de fazer isso na sua casa. É um tablete muito pequenininho que a gente coloca em um balde com 50 litros”, diz ele. A pessoa só precisa se organizar em relação às datas para reaplicar o produto.
Os locais para aplicação devem ser os possíveis criadouros de mosquito, onde tem água parada ou onde ela tem chance de parar. O produto pode ser aplicado em local seco e quando este for reidratado, o larvicida continuará ativo. Depois de aplicado, o efeito do produto dura até 60 dias.
Perez ressalta, entretanto, que o uso do larvicida deve ser adotado como um recurso adicional aos cuidados que a população precisa continuar a ter. “Não é para desaprender os nossos 10 minutinhos semanais contra a dengue. Não dá para deixarmos de cuidar do nosso jardim e acabar com as nossas tralhas”, lembra.
“O Aedes é muito oportunista”, ressalta Perez, por isso, “locais como caixas d´água, devem ser lacrados e o extravasor de água (popularmente conhecido como ladrão) receber uma tela mosquiteiro”.
Além dos cuidados com a caixa d´água e com o lixo, é preciso estar atento aos criadouros domésticos do mosquito, alerta o engenheiro. “São criadouros da nossa cultura. A gente quer viver com eles, então a gente tem que cuidar deles de um jeito que não estamos cuidando e o estrago está feito. Ora, morreram mais de 10 mil brasileiros!”.
Muitos dos Liras (Levantamento do Índice de Infestação do Aedes Aegypti), que as prefeituras fazem para mostrar a quantidade de criadouros potencialmente existentes nos municípios ao longo do ano, apontam que cerca de “7% dos criadores positivos são água de abastecimento de animais domésticos”, sublinha Perez.
“Todo mundo que tem uma geladeira frost free tem um criador para chamar de seu”, diz Perez, com uma “bandeja escurinha e quentinha como o Aedes gosta”, localizada em cima do motor para receber a água do degelo. Para evitar a procriação de mosquito, a pessoa pode afastar a geladeira, escoar a água e escovar o local com vigor semanalmente, alerta Perez, ou se servir dessa tecnologia a cada 60 dias.”
A ideia de se colocar numa pílula do tamanho de um AAS infantil todo esse componente tecnológico, na avaliação de Perez, “é disruptiva”, porque ao mesmo tempo que é capaz de matar em poucas horas a larva do mosquito, tem efeito prolongado. “Na prática, ela se torna viável por permitir uma maior adesão, não ser onerosa do ponto de vista nem do trabalho nem do orçamento familiar”, explica. Atualmente, ele informa que o comprimido de DengueTech está custando R$6 (seis reais).
Atualmente a BR3 consegue produzir um milhão de doses por mês, mas Perez assegura que a empresa tem capacidade de aumentar rapidamente a produção, “pois ao longo do tempo a gente vem se dedicando a entender os gargalos de produção e mitigou ao extremo todo o risco da escalada tecnológica”.
Perez acredita que o cuidado larvário é o mais inteligente e sustentável e pode ser de grande ajuda nesse momento em que a dengue vem pressionando as equipes de agentes de endemia. “Todo mundo sabe que o fumacê só vai bloquear um pouquinho a transmissão da doença naquele bairro que está ardendo em febre. O resto da cidade está à mercê do mosquito, porque não tem gente, não tem produto, não tem tecnologia para ser aplicado, e muito menos equipe”.
Além da dengue, Perez lembra que o Brasil precisa ainda lidar com o vírus da zika e da chikungunya, todos transmitidos pelo mesmo mosquito. “A dengue é a avenida que o Aedes estabelece para passarem as arboviroses”. A utilização do DengueTech, em sua avaliação, pode contribuir para o enfrentamento da transmissão dessas doenças, pois é uma inovação que oferece mais velocidade e capacidade de resposta no combate ao mosquito.